Entrevista conduzida por Adriana Mayrinck
1 -
Quem é o autor Emanuel Lomelino? E como a poesia reflete na sua forma de
estar na vida ?
R – O
autor Emanuel Lomelino é uma entidade que se distanciou do cidadão Emanuel
Lomelino, após a edição do segundo livro, e que se rege por conceitos muito próprios
e todos direccionados para a criação. Tem o mesmo grau de exigência e rigor mas
apenas se preocupa com o que cria. Já o cidadão é mais opinativo e
intransigente, e não tem problema algum em falar o que pensa. Se há alguma
influência da poesia na forma de estar na vida, essa será apenas pelo tempo e
dedicação empregues. Por isso acho que a vida influencia mais a poesia do que o
contrário.
2-
Seus títulos são marcantes e remetem a fases da sua caminhada poética.
Auto-retrato ou criação independente do homem?
R –
Pode-se considerar que os dois primeiros títulos, ainda tocados pela inocência
ou, dito de melhor forma, pelo estado ainda imberbe do autor, têm doses
elevadas de autobiografia. A partir daí, com a aprendizagem, entretanto
adquirida, nasceu uma maior consciência de autor e todos os trabalhos
posteriores passaram a ser menos pessoais, mais criteriosos e alvo de maior
grau de auto exigência.
3-
Conte-nos um pouco da sua obra e de suas expectativas como autor.
R – A
obra nasceu, primeiro pelo concretizar de um sonho, depois por mera conjugação
de oportunidades. Neste momento o sonho está mais que realizado e, enquanto as
oportunidades forem aparecendo, cá estarei para acrescentar mais alguns
trabalhos. Não tenho expectativas porque nunca as crio e porque, mesmo que as
oportunidades um dia deixem de aparecer, não me incomodará em nada deixar de
editar pois o que me move é escrever. Eu edito porque escrevo… não escrevo para
editar.
4-
Percebemos a sua versatilidade e facilidade de adaptação poética em linguagens
diferenciadas. Heterônimos?
R –
Não! A minha esquizofrenia é una e indivisível. Mais a sério, é apenas uma
característica que junto a outras e que servem de ferramentas de criação. Por
outro lado, até me convém ter essa versatilidade pois sou muito avesso a
rotinas e gosto de me desafiar enquanto autor.
5- O
poder criativo é ilimitado. Previsão para novas publicações? Comente sobre
essas possibilidades, há um planejamento ou os livros acontecem?
R –
Existe uma ideia central, fruto da tal consciência de autor que mencionei
noutra questão, mas que é susceptível de alterações motivadas pelas
oportunidades que vão surgindo. Dou um exemplo: seguindo essa minha ideia
inicial, o meu terceiro livro não seria o LICENÇA POÉTICA – DUETOS LOMELINOS…
eu tinha um outro livro pronto para ser editado, no entanto na mesma altura
foi-me oferecido um contrato editorial, que dificilmente poderia recusar, e que
consistia na elaboração desse projecto de duetos. O outro ficou na gaveta
esperando decisões. Quanto a trabalhos futuros… há um em fase de pré-edição,
que também não estava programado mas é uma oportunidade que não podia deixar
passar. Para além deste há muito material pronto, somente à espera de
interessados.
6 - O
TOCA A ESCREVER, seu blogue, criado há sete anos é um projeto de relevância e a
cada dia acrescenta novos autores e leitores. É um trabalho de dedicação,
persistência, disciplina e sem retorno financeiro. Ideologia, sonho ou utopia?
R – O
TOCA A ESCREVER nasceu motivado por uma lacuna que detectei no universo da
escrita: a falta de divulgação dos livros editados. Mais que um trabalho, e
apesar de dar mesmo muito e consumir muitas horas, é uma paixão que,
felizmente, tem vindo a crescer com o patrocínio de editoras e alguns autores.
E agora, com a parceria da IN-FINITA, e a junção de forças por um objectivo
comum, esse crescimento foi mais acelerado.
7- No
TOCA A FALAR DISSO você expõe a sua opinião de forma clara, transparente,
nua e crua. O mercado literário é um meio bem delicado em se conviver, como é a
receptividade do leitor , autores e editoras na sua espontaneidade de se
mostrar sempre autêntico e firme em suas opiniões. Te impulsiona ou te freia
para novas ações e interações?
R – o TOCA
A FALAR DISSO tem mais o cunho do homem do que do autor. Enquanto o autor se
dedica a criar e a tentar fazer obra, o homem é mais crítico e, tendo a
possibilidade de expressar a minha opinião, jamais deixarei de o fazer. Isso
não quer dizer que estejas sempre certo no que escrevo. As minhas opiniões são
fruto das minhas verdades e nunca foi minha intenção impingir aos outros as
minhas ideias nem o faço para arranjar seguidores para elas. Limito-me a lançar
os temas para debate e depois cada um que pense pela sua cabeça. Dito isto, não
me preocupo nem um pouco com a sensibilidade de quem está no meio literário.
Ter isso em consideração obrigar-me-ia a censurar o meu pensamento e a não o
expressar. E o livre pensamento e a liberdade de expressão são dois direitos
que não abdico.
8-
Uma vida dedicada a arte da escrita, e uma caminhada permanente, ininterrupta e
consolidada. Há um objetivo ou desejo ainda não realizado ?
R –
Como disse anteriormente, o objectivo era editar e isso foi alcançado. Depois o
objectivo passou a ser ter três livros editados e parar. Entretanto as
oportunidades foram aparecendo e esse objectivo cumpriu-se pela metade e tudo o
que tenho feito desde aí já não faz parte de nenhum objectivo delineado. Neste
momento tenho-me limitado a ir na onda. Já fiz de tudo no universo da escrita,
já vivi algumas coisas que, se não fosse a escrita, nunca as teria vivido. A
minha certeza é que continuarei a escrever e o que vier será bem vindo e se
deixar de vir não tem problema porque, como também disse, eu edito porque
escrevo… não escrevo para editar.
9-
Como é o profissional Emanuel Lomelino, seja como organizador de coletâneas e
antologias, prefaciador ou palestrante. Há uma linha de conduta ? Mistura-se
com o autor ou são vertentes distintas?
R – O
autor é a extensão criativa e tudo o resto é responsabilidade do homem. É
evidente que existem pontos de contacto mas apenas em alguns aspectos de
conduta. Quando estou envolvido nessas actividades mencionadas sou, tal como o
autor, exigente e rigoroso, mas muito mais intransigente e faço tudo para que
os resultados finais estejam o mais próximo possível da perfeição. Apesar da
tremenda realização que essas tarefas me proporcionam, é muito raro ficar
totalmente satisfeito com o resultado final.
10- Um
desabafo. O que mais te incomoda? Uma alegria. O que te move?
R – Não
sou homem de me incomodar. No entanto, há alguns assuntos que não me deixam
ficar sossegado, nomeadamente a questão do plágio e a incompetência consciente.
Quanto ao resto… sou demasiado desligado. Para mim o mais importante de tudo é
chegar ao fim de cada dia e ter consciência que fui fiel a mim e aos meus
princípios, encostar a cabeça no travesseiro e adormecer tranquilamente.