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sem dúvida as férias de verão mais espectaculares que ela viveu. Filipa desejou
que elas nunca mais chegassem ao fim.
Naquele
ano, os seus pais, sempre receosos pela sua saúde frágil, deixaram-na na Caxica,
uma das fazendas de café do tio António, irmão mais novo do seu pai.
Quando
se entrava na fazenda, era preciso percorrer cerca de 2km até se chegar à casa.
A estrada, era em terra batida e ao longo dela e de cada lado, uma grande mata
repleta de árvores e arbustos floridos e de animais que por vezes se
surpreendia a passearem descontraídos.
Quando
por fim se avistava a casa, era uma grande casa térrea, de estilo colonial e as
suas paredes eram revestidas com mosaicos de cor alaranjada; tinha um terraço
coberto por uma trepadeira de flores amarelas e o pátio era tão grande, que
podia acolher mais de 20 automóveis. Tinha 12 quartos e 10 casas-de-banho, 1
grande sala de refeições e 2 salões enormes para as festas e recepções.
Na
parte de trás, havia o equivalente a um bosque e uma parte dele tinha sido
transformado em jardim. Uma grande mesa rectangular decorava este espaço, assim
como gaiolas gigantes com pombas e pássaros de várias espécies, vários baloiços
aqui e ali e até um coreto tinha. Mais afastado, estavam as capoeiras com
galinhas, patos e perus, os currais com porcos, cabras e ovelhas e os estábulos
com dois cavalos magníficos.
Para
uma menina da cidade, que vivia numa casa dita normal, tudo aquilo era
deslumbrante.
Mas
o seu tio, não era só o dono e o gestor da Caxica, o seu tio era o enfermeiro
voluntário que cuidava da saúde física e emocional, dentro das suas
competências, de todos os trabalhadores, habitantes da fazenda, que eram seus
empregados, que por sua vez, passavam a palavra a outros da região e arredores.
Os
dias foram passando a brincar e tratar dos animais, a andar a cavalo com o
rapaz da estrebaria, e baloiçar em todos os baloiços.
A
comida era ótima e variada. O João, que era o mordomo e também o chefe
cozinheiro, levava-a para a cozinha e deixava-a ajudá-lo nas coisas simples.
O
que ela gostava mesmo, era de vê-lo fazer o pão com ovos que ele depois moldava
em trança e era servido todos os dias ao pequeno-almoço, quentinho, com
manteiga e doce de maracujá ou papaia, de manga ou ananás. Omeletes e ovos
mexidos ou estrelados, com os ovos acabadinhos de pôr pelas galinhas, chouriço
frito, e bifes, bolo de mandioca ou de milho. A mesa era farta e o pessoal doméstico
também usufruía desta fartura.
A
Francisca, era a sua camareira. Era doce e meiga.
Tinha
começado a frequentar a escola há um tempo atrás, e já lia algumas frases.
Ficou radiante quando viu os tantos livros coloridos da coleção ‘’Anita’’ que a
Filipa tinha levado. O momento de ir para a cama, tornou-se festivo. Todas as
noites, depois do banho, sentavam-se as duas no chão a lerem todas aquelas
estórias. Houve mesmo uma vez que adormeceram as duas, uma contra a outra até ao
dia seguinte. Foi uma grande risada e foi assim também que veio a ideia de
pedir ao tio António se deixava dormir a Francisca no mesmo quarto que ela; pedido
que foi aceite.
Naquela
fazenda, esquecia-se o rebuliço do quotidiano, a vida era vivida com sossego.
O
tio António era uma pessoa pousada, calma e muito generosa. O mesmo não se
podia dizer do seu capataz que estava sempre em desacordo com ele e de quem
todos tinham muito medo; até a Filipa o evitava.
Uma
semana antes das férias acabarem, o tio António levou a Filipa em todas as suas
expedições pelas fazendas e pelas aldeias onde viviam os empregados que
trabalhavam nas roças de café e apesar de só ter 10 anos, viu o humanismo no
trato que o seu tio tinha com aqueles trabalhadores, que quase de Sol a Sol
labutavam. Ouviu-o com frequência dizer que precisavam de se repousar um dia ou
dois e quando eles se negavam por causa do medo que tinham do capataz, ouviu-o
também dizer, que ele mesmo lhe falaria.
Este
testemunho de altruísmo, de bondade e empatia, ficou para sempre gravado no
espírito da Filipa, fazendo com que ela crescesse com verdadeiros valores e com
respeito por todo o ser humano, independentemente da sua condição sociocultural.
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