PERFIL
I
Muitas
em uma morte súbita
[movimento uniforme retilíneo]
nenhuma em comando-sério
[movimento uniforme retilíneo]
nenhuma em comando-sério
no
meio do ninho
um amor de menino
um amor de menino
um
passo em falso , iria ao fundo
era o cadafalso ou quase-número
era o cadafalso ou quase-número
havia
uma brecha eu juro
parte de mim em fuga
câmera lenta sob vaga memória
um sorriso labiata rosa
os olhos em penumbra fria
parte de mim em fuga
câmera lenta sob vaga memória
um sorriso labiata rosa
os olhos em penumbra fria
houve
um suspiro profundo na hora
a ponte vazia e o cansaço
sob a pele morna de um corpo esguio
a ponte vazia e o cansaço
sob a pele morna de um corpo esguio
restou
no plano raso deste tempo
um quarto em labirinto
roupas sujas soterradas pelo caminho.
um quarto em labirinto
roupas sujas soterradas pelo caminho.
II
Não
era o fim
era a contramão a chance segunda
dentro da manhã girassol que se abria
era a contramão a chance segunda
dentro da manhã girassol que se abria
O
menino foi ao pai
a mulher , entre paisagens secretas ,
perdia-se no calor do horizonte em novos destinos
a mulher , entre paisagens secretas ,
perdia-se no calor do horizonte em novos destinos
de
repente uma escada- caracol
o desterro dos heróis em alteridade
a fertilidade recebida e mais um ninho
o desterro dos heróis em alteridade
a fertilidade recebida e mais um ninho
a
mancha que se fixou lá trás
ficaria ali mesmo resguardada
nas letras do romance - chave
ficaria ali mesmo resguardada
nas letras do romance - chave
PORTAIS
de uma mente aberta
fluxograma fractais flutuantes
nomes de muitas miragens -tema
fluxograma fractais flutuantes
nomes de muitas miragens -tema
III
congratulamos
IV
Personas
se reconstroem
energia - volatilidade que se refaz
agora , o ontem e o amanha sinalizam paz
energia - volatilidade que se refaz
agora , o ontem e o amanha sinalizam paz
Uma
cor poliu dentro
violeta é o signo em astral
sigo catalizando oxigênio:
violeta é o signo em astral
sigo catalizando oxigênio:
es/cre[ver
m[editar]
em des]contínuo movimento
m[editar]
em des]contínuo movimento
V
o
menino está um rapaz
Poços de Caldas 19/20 de agosto de 2016.
EMERGIR – depoimento: esta
oportunidade que presentifiquei junto à curadoria do Instituto Tomie Otake dia
01 de abril a 21 de maio dentro de uma das instalações da artista Yoko Ono – em
São Paulo - Brasil foi um momento ímpar em minha vida - porque senti
– experimentei já que era esta a proposta da artista contemporânea o acolhimento
- ao lado de inúmeras outras mulheres - para trazer à tona - e com coragem -
aquilo que muitas de nós não sabemos lidar, ali em nosso dia a dia – o
machismo - isto que nos rodeia e que como uma praga consentida - apregoada - e
cultural levam-nos a situações quase irreversíveis, muitas perdas traumas e à
morte. Quando me deparei em 1997 – em litígio - eu sinceramente não me via
envolvida no que hoje eu posso afirmar ser questão de gênero – por mais que eu
tivesse informações e senso crítico, minha situação ali e naquele momento era
unicamente de foro íntimo e emocional - a tal crise na relação como falávamos
entre nós mulheres profissionais e de classe média. Eu mulher independente,
mãe independente em plena conquista de espaço profissional e econômico - para o
casal não faltava nada a princípio. Não era portanto questão de ordem material.
Daí que ter passado por tamanha humilhação e perdas culminando quase com a
própria vida, ter feito desta experiência dolorida - o quase feminícido – tema
em parte do meu trabalho artístico é porque também tive minha família por perto
como suporte - inclusive apoio de profissionais da área de direito e psicologia
neste tempos de dor - antes ainda da lei Maria da Penha - um suporte essencial
no sentido de me fortalecer e me reestruturar novamente, eu tão produtiva – era
ali uma ave abatida e em falência pessoal por anos a fio.
Chamar “aquilo” de machismo não estava a meu alcance – havia afeto envolvido -
havia intimidade envolvida e cumplicidade - e não somente “dados frios” dados
estatísticos - a matemática do caso - a realidade. No momento do possível crime
hediondo - estamos sós - em nossos leitos - em nossos quartos e portanto
vulneráveis, absolutamente vulneráveis. Em horários de responsabilidades e de
seguirmos a rotina de trabalho e das tarefas diárias - a roupa na máquina a
comida no fogo, a faxina da casa, a saída a chegada do mercado – a troca de
roupas de cama, no banho desnudas na parafernália das multifunções. A criança
por perto.
Sitiadas. ''Vivo no quase, no nunca e no sempre. Quase, quase - e por um triz
escapo.'' A Cidade Sitiada - Clarice Lispector
Daí que "aquilo" passa uma vez passa a segunda vez até que num
certo dia nos sentimos frágeis inseguras e com medo e vergonha, a indescritível
vergonha da exposição – à família, aos amigos e aos colegas. O medo dentro
deste contexto é que faz com que evitemos denunciar, cobrar e punir – nossos
companheiros nossos amores pai de nossos filhos. Algo impossível - denunciar – o
homem com quem dormimos dividimos tarefas contas e afetos - quase impossível. Estive
sete vezes em denúncia nas delegacias de mulheres todas as vezes aterrorizada e
vulnerável ao retornar para casa já em separação de corpos mas não de bens -
estes que ainda procuro em segunda instância no estado de Santa Catarina –
estes anos de luta e resistência.
Eu não sei como eu sobrevivi às
chantagens e às milhares de ameaças de morte ao assédio pós separação que
continuaram – eu não sei. Havia ali e no momento de ruptura alguma e qualquer
outra coisa que eu não consigo nomear ainda: Deus? Sorte? Energia? Aquele
segundo - o quase – que nome eu daria, minha gente que nome? O fato é
que sobrevivi - e de lá daquela noite de muito ódio e quase morte - talvez um
dia eu consiga detalhar friamente – daquele dia muitos anos se passaram –
escrevi Duty Free-2000 – lugar narrativo onde exponho através da onisciência o
que poderia ter sido e não foi. Na ficção o algoz recebe o veredicto
merecido. Passados 20 anos é fácil agora - EMERGIR – nesta oportunidade
junto de dezenas de outras mulheres que apoiadas no evento puderam narrar –
significar os fatos ocorridos e por isso procurar respostas e principalmente
soluções. Compreender dados – os números e perguntar o porquê, sempre e mais o
porquê de tantos homens cada dia mais matarem e de modo assustador suas
mulheres, de onde vem este sentimento - contramão de tudo que se quis lá no
início - não era amor? Quem são os culpados: Estado – o sistema do ter e não
ser? A História da Humanidade? A Moral? A Escola? Como lidar - na lei
esta elaborada por homens - na estrutura social dominada por homens em clubes
de homens, como lidar com este que penso hoje- ser no Brasil-nossa guerra, o 5
país em feminicídio. Se eu como toda a formação que tenho não percebia a
resposta e principalmente não me via em um caso clássico de machismo e
misoginia que dirá grande parte de nossa sociedade - intrinsecamente imersa no
problema e reativa a encarar de frente esta questão... pergunto-me, eu ainda
aqui, a sobrevivente. Precisamos sim continuar o debate, e este dentro de um
contexto coletivo social economicamente justo histórico e democrático. Debate
entre as diversas formas de representatividade. Eu não desisti da vida na
verdade tudo que me aconteceu deixou-me potencialmente alerta pró-ativa e com
carga suficiente de compaixão por todos nós os envolvidos machos fêmeas e
transgêneros. Relatos que li nesta exposição foram de cortar o coração, porque
muitos deles aconteceram em plena infância destas mulheres: estupro seguido de
morte - assédio moral no trabalho – perdas de seus filhos ali mortos a seus
lados a pior de todas as vinganças – Seus algozes eram muitas vezes seus
irmãos, amantes e pais, muitos casos de parentes próximos - e por fim seus
maridos e companheiros. Precisamos chamar a sociedade para um debate sério que
nos leve a educar estes cidadãos seus cúmplices sociais e as mulheres passivas,
“as do não é comigo” as do “devem ter feito por merecer” soluções para um novo
tempo. Muitas sociedades que passaram por estas dores encontraram saídas - se
não via lei - e punição - via educação emocional e inclusiva penso eu que
juntas, lembrando-nos em tempo que precisamos reverter estas dores - como quem
coloca a mão na pasta grossa de dejetos pútridos – o machismo - este que nos
impede de prosseguir e para o bem-estar de todos. A união de nós mulheres e
gêneros será para mim como foi em EMERGIR – sinalizador - potencial de
transformação. Demais será chover no molhado, atacando indivíduos o político o
ator o machista da esquina - um a um - milhares milhões em sua inconsciente
incapacidade de respeitar o outro em especial a nós mulheres - é chover pingo a
pingo também o sangue que estes nos cobram historicamente. Basta.
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