sexta-feira, 23 de junho de 2023

Maria Dulce (excerto) - FÁTIMA D'OLIVEIRA

LIVRO GENTILMENTE CEDIDO POR IN-FINITA
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Como já era habitual, Maria Dulce sentia-se meio perdida e incompleta. Ela sempre tinha atribuído esse sentimento, essa… essa sensação ao desaparecimento precoce da mãe. Não devido à morte desta última, mas simplesmente porque ela tinha mesmo desaparecido: era o dia do sexto aniversario de Maria Dulce e ela estava a brincar com a boneca que tinha acabado de receber, quando ouve a mãe dizer “Já chega!” e vê-a sair porta fora. E foi assim: sem saber como nem porquê, Maria Dulce viu a sua mãe sair da sua vida e nunca mais lhe pôs a vista em cima. Infelizmente, esse dia tinha ficado gravado a ferro e fogo na sua memória e nas suas entranhas: Maria Dulce lembrava-se de cada momento daquele dia, até ao mais ínfimo pormenor: desde o vestido cor-de-ameixa da mãe, até ao seu perfume pautado pelo toque das flores de cerejeira.
Essa fuga para a frente sempre a tinha assombrado, inundando-a de uma culpa que quase a afogava. Maria Dulce sabia muito bem e tinha plena consciência de que essa culpa, propriamente dita, não lhe pertencia, mas a verdade é que a sentia: e por mais que tentasse sacudir esse malfadado fardo, era inútil: aquela era uma batalha logo perdida, à partida, pois mais que atropelada, era abafada, até esmagada pela tal culpa que, verdade verdadinha, não era dela, nem de perto nem de longe.

EM - EXPRESSÃO - COLETÂNEA - IN-FINITA

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