quinta-feira, 20 de janeiro de 2022

Alta Rotação – GABRIELA LUÍS

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Podia estar confortável, mas não estava. A tensão bloqueava-me as pernas, as costas e aquele som fino que fazia perto do meu ouvido deixava-me os pêlos eriçados.

Já não podia sair dali, não havia volta a dar. A cada movimento que acontecia fora e dentro de mim eu agarrava com mais força a mão que me amparava, confiando que tudo iria correr bem.

Fechei os olhos e tentei perceber onde estava o meu coração, se já tinha descido da garganta para o peito. Conseguia ouvir o seu bater num ritmo mais controlado, constante, semelhante ao som da velocidade cíclica do motor.

A minha cabeça estava a ficar pesada, os sentidos adormecidos, a boca seca… Nesse estado, viajei pelos recantos da minha memória tentando encontrar cenários semelhantes, onde tudo tinha corrido bem. Estava a imaginar a minha história naquele momento, como ela se poderia desenrolar, os planos que a mente me apresentava para eu escolher, entre o medo e a aceitação de que embora quisesse controlar aquela parte de mim, nada poderia fazer! Por breves instantes deixei-me ali estar, consciente do medo que sentia.

As gotículas de água e saliva projectadas na minha face, faziam-me passar da consciência exterior para o meu mundo interior, observando a língua pálida e mole que deixava cada gotícula de água escorrer, lentamente, até ser engolida ou removida por aquele objecto que entrava pelos meus lábios abertos.

Em desamparo, doei-me àquele momento, confiando as minhas entranhas ao que sentia lá tocar, não pensando em mais nada, deixei os meus sentidos embalarem-se novamente pela velocidade rasgada e penetrante do instrumento que a mão dele possuía. Sem me dar conta, adormeci.

Quando abri os olhos, ofuscada pela luz que vinha da lâmpada da cadeira do Dentista e sentindo que aquele som desaparecera, percebi que a consulta tinha terminado!

EM - VERSO & PROSA - COLECTÃNEA - IN-FINITA

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