domingo, 15 de novembro de 2020

Cangalha do Vento (excerto III) - LUIZ EUDES

LIVRO GENTILMENTE CEDIDO POR IN-FINITA
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Depois de tantos anos, lá estava a mulher, diante dos seus olhos de homem duro, respirando com uma tranquilidade mórbida. Eles eram fortes. Juntos trabalharam e amaram-se em noites quentes, mais um filho e outro e outro; um filho é uma boca, mas também são braços para o lavor. Já havia enviado ao mundo nove e agora o décimo parecia ser demais. Aristeu engoliu uma saliva grossa quando os olhos da mulher tornaram-se oblíquos, de um brilho febril de quem vê a face irredutível da morte.

Era uma noite densa, de nuvens carregadas e ventos frios assoviavam na vegetação criando a sensação de assombrações que ali se revelavam. Aristeu implorava à parteira Salustiana, que fora trazida às pressas pelo filho pequeno, José Paulo. O menino observou a velha parteira que fuçava no meio de Dona Tereza com um pesar na expressão. Mas não havia mais vida ali, além do pequeno ser de bochechas cheias, saudável, que havia deixado o corpo moribundo da pobre mãe e agora chorava diante do mundo estranho ao qual era apresentado. Era uma menina. Com a voz embargada o velho Aristeu disse: Vai chamar-se Tereza, como a mãe – e silenciou tão acentuadamente que a recém-nascida também parou de chorar diante daquela estranheza.

 EM - CANGALHA DO VENTO - LUIZ EUDES - IN-FINITA

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