quarta-feira, 29 de abril de 2020

Em tempos de quarentena - ANA MENDES


E NASCE A PAZ EM MIM

Perdida nos meus pensamentos e desalentos, com a minha taça de café já frio...
Apreciando esta linda noite de luar, como tantas outras da minha varanda.
Ao longe ondas mansas se desfazem, acariciando o areal, som melodioso que faz bem ao moral.
Deste período de confinamento, guardo a esperança que me trás paz.
Aquele tesouro que nasce depois da incompreensão, da dor, da revolta e desolação...
Como pode o mundo despertar a cada manhã e concordar em carregar tanta tristeza?!
Quanta energia para poder aceitar, que o homem só existe através do poder, do dinheiro, da glória, abandonando por isso tudo, algo bem maior?!
Esquece, abandona ou troca o valor da vida simples e pura, por momentos de prazer sem remorsos ou por segundos de ilusórias aventuras.
Agora a terra acorda e grita de alegria, os pássaros esvoaçam pelos céus de cores intensas, em liberdade, não seguem os traços de aviões apressados de chegar ou voltar e sem fumaças de chaminés altas ou baixas. Apenas esvoaçam por prazer.
Outros correm em pradarias ou florestas sem medos, mas talvez invente eu um postal efêmero para enviar ao meu melhor amigo.
O mundo já não é só nosso, agora o devolvemos... Ou foi pelo rei de corôa, sem cavalo ou reino rico, fatal vírus que nos tormenta e nos coloca em perigo.
E se o dia nasce na separação da noite e o horizonte, acompanhado de nuvens ansiosas por libertar sobre o mundo um doce chover, é a primavera a querer espalhar as suas cores sobre as flores, o trigo e pomares a crescer.
O vento levantou-se de mansinho e o sono fez-se presente, nos meus olhos e pelo corpo uma moleza se aconchegou  devagarinho.
Ligo o telefone e leio com alegria, uma mensagem de um ente querido. Desejos de um amanhecer suave, com carinho.
O silêncio enche o espaço e acompanha-me com pudor ao leito. Sabe ele tão bem o que me vai na alma e no peito.
Hoje houve aplausos e cânticos, ainda que se carregue a dor, foi por agradecimento e amor aos amigos de farda verde, azul, vermelha ou branca.
Heróis plastificados, mascarados e prontos para a guerra, sem taças, medalhas ou louvores.
Talvez amanhã nos possamos reunir, olhar nos olhos, agarrar mãos e beijar quem nos quiser sentir...
Assim me deito esperançada, pois a paz nasceu-me na alma, vai-me até amanhã embalar...
                                                                          
Ana Mendes

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