Agradecemos à autora ESTHER ALCÂNTARA a disponibilidade em responder ao nosso questionário
1 - Como se define enquanto autora e pessoa?
Considero impossível uma autodefinição precisa, pois me sinto em
permanente construção durante a viagem que é o tempo neste mundo. Mas pensando
em quem tenho sido, posso dizer ao menos que sou voltada para humanidades. Tudo
o que reflete o ser humano em sua instância mais profunda me interessa, em
especial a cultura que produzimos, a arte com que nos expressamos. Desde menina
me envolvo com artes, e a escrita é a arte que escolhi como forma principal de
expressão. Ou fui escolhida por ela, fisgada pela literatura. Aos cinco anos
comecei a ler e os livros se tornaram paixão. Não demorei muito para esboçar os
primeiros versos, e a escrita fluiu fácil também na escola, assim como o amor
pela linguagem e pela palavra. Importa-me escrever de forma autêntica, sem
alimentar demasiadas expectativas de reconhecimento. Escrever é plantio, e é
essencial escolher sementes íntegras e de qualidade, para na colheita ter
frutos maduros e saborosos, mesmo que poucos, em vez de retornos ilusórios que
nos envaidecem e desviam o foco, prejudicando o crescimento como pessoa e
escritor, sempre em formação.
2 - O que a inspira?
A vida, o dia a dia, as coisas do cotidiano, a singeleza, os outros
seres, a arte, as leituras, os sentimentos, as sensações, as provocações, os desafios...
Tudo! Em especial, tudo o que envolve contato humano. Amo a troca que se dá nas
relações, embora muitas vezes a sofra. Só consigo escrever se sou inteira no
que vivo e nas relações, derramando ingenuidade a cântaros, por escolha, por recusa
consciente a perdê-la. No dia em que me tornar uma pessoa “armada” ou cheia de
escudos, talvez não possa mais escrever ou, no mínimo, deixe de ser poeta.
Espero não me render. Corro para o abraço, acolho, e o que fica na peneira é
sempre inspirador.
3 - Existem tabus na sua escrita? Porquê?
Todos nós temos tabus inconscientes, bem como preconceitos, por mais que
neguemos. Busco vencê-los e estar aberta a temas, embora me veja no direito de
escolhas na escrita, do mesmo modo que escolho o que ler. E escolhas muitas
vezes são confundidas com tabus, assim como conceitos são tomados por
preconceitos. Estamos num mundo e momento em que a maioria pensa ser preciso
fazer tudo ou falar sobre tudo para ser livre ou libertário. Mas ninguém é
realmente especialista em tudo nem se deixa tocar por tudo. Não, não me vejo na
obrigação de escrever sobre tudo, e isso também é liberdade. Ou ao menos é
libertador! A literatura é muito mais que texto para sorrir ou entreter; muitas
vezes nos faz sofrer, desconstrói, provoca, reconstrói, impulsiona... Faz
diferença para além de um instante. É essa a literatura que amo e a que almejo.
Jamais vou escrever qualquer coisa que objetifique a mulher, por exemplo. Porque
literatura demanda responsabilidade, não é mero alimento para o ego, aberto a
tudo o que atraia holofotes. Assim, a (auto)cobrança de não se ter “tabus” pode
ser uma armadilha e um desserviço à literatura. Melhor a escrita genuína e
autêntica, ao meu ver.
4 - Que importância dá às antologias e colectâneas?
Participo de algumas. Penso que é um bom começo, bom recurso para um
escritor que por qualquer motivo ainda não conseguiu publicar seu livro. Também
podem ser significativas, se bem contextualizadas ou com temática importante
para o escritor. Porém, quase sempre a divulgação é fraca e elas acabam
alcançando poucos leitores. Além disso, poucas primam pela qualidade; a maioria
dos editores de antologias não tem muito critério para escolher integrantes,
especialmente quando envolve dinheiro. Não só como escritora, mas como editora,
eu me preocupo muito com esses aspectos negativos e penso que se deve dar mais atenção
a eles para que as antologias e coletâneas sejam sempre impactantes e
importantes.
5 - Que impacto têm as redes sociais no seu percurso?
As redes sociais têm facilitado a conexão com outros escritores e a
divulgação da escrita. No caso da poesia, tem sido essencial a conexão entre
poetas, visto que poeta lê poeta – ou espera-se que leia, e comenta poeta, o
que se espera e contribui para o crescimento. O perigo é que o escritor só leia
pela rede, ficando carente de formação mais aprofundada e de ir além da
contemporaneidade. Isso muitas vezes o torna vítima de modismos, receitas
prontas de “sucesso”, supervalorização da fama e de brilhar num grupo, ao
menos, legando a qualidade literária a segundo plano ou a plano nenhum. Mas a
troca é positiva, desde que se busque a justa medida.
6 - Quais os pontos positivos e negativos do universo da escrita?
Não somos mais os mesmos escritores nem os mesmos leitores, com um tempo
diferente e uma expansão de informações mais plena, universal. Paradoxalmente,
não vejo universo de nada, mas diversas bolhas que dificilmente interagem.
Assim, embora haja maior alcance de formação para o escritor, com mais
facilidade para pesquisa e conhecimento, há mais engodos. “É preciso estar
atento e forte!”
7 - O que acredita ser essencial na divulgação de um autor?
A divulgação hoje pode se dar por diversas formas, assim como a
distribuição do livro. O autor pode ser divulgado por agentes literários e se
divulgar também, apresentando seu trabalho em saraus e virtualmente sempre que
possível. As possibilidades são muitas, das mais tradicionais às mais
criativas.
8 - Quais os projectos para o futuro?
Sou essencialmente poeta e, em minhas incursões pela prosa, sempre optei
pelo gênero crônica; escrevi alguns contos também, mas poucos. Tenho como
projeto e desafio a escrita de um romance. Para isso tenho buscado me preparar,
com muita leitura, oficinas, estudos.
9 - Sugira um autor e um livro!
É muito difícil sugerir um único livro! Dos marcantes, sugiro “O jogo da
amarelinha”, de Julio Cortázar, “Os trabalhadores do mar”, de Victor Hugo, e
“Terra Sonâmbula”, de Mia Couto. Mas também nosso Guimarães, Érico Veríssimo,
Machado, Clarice. Na poesia, sugiro tudo do João Cabral de Mello Neto, meu
primeiro poeta-amor, Quintana, Neruda, Manoel de Barros, Bandeira, Leminski,
T.S. Eliot, Cecília Meireles. Ah, não falei que era missão impossível sugerir
só um?
10 - Qual a pergunta que gostaria que lhe fizessem? E como responderia?
Não consegui pensar em nenhuma. Talvez eu esteja aberta a qualquer pergunta,
porque, se não puder responder, levá-la comigo é estimulante e enriquecedor.
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