terça-feira, 31 de julho de 2018

DEZ PERGUNTAS A... ESTHER ALCÂNTARA


Agradecemos à autora ESTHER ALCÂNTARA a disponibilidade em responder ao nosso questionário 

1 - Como se define enquanto autora e pessoa?

Considero impossível uma autodefinição precisa, pois me sinto em permanente construção durante a viagem que é o tempo neste mundo. Mas pensando em quem tenho sido, posso dizer ao menos que sou voltada para humanidades. Tudo o que reflete o ser humano em sua instância mais profunda me interessa, em especial a cultura que produzimos, a arte com que nos expressamos. Desde menina me envolvo com artes, e a escrita é a arte que escolhi como forma principal de expressão. Ou fui escolhida por ela, fisgada pela literatura. Aos cinco anos comecei a ler e os livros se tornaram paixão. Não demorei muito para esboçar os primeiros versos, e a escrita fluiu fácil também na escola, assim como o amor pela linguagem e pela palavra. Importa-me escrever de forma autêntica, sem alimentar demasiadas expectativas de reconhecimento. Escrever é plantio, e é essencial escolher sementes íntegras e de qualidade, para na colheita ter frutos maduros e saborosos, mesmo que poucos, em vez de retornos ilusórios que nos envaidecem e desviam o foco, prejudicando o crescimento como pessoa e escritor, sempre em formação.

2 - O que a inspira?

A vida, o dia a dia, as coisas do cotidiano, a singeleza, os outros seres, a arte, as leituras, os sentimentos, as sensações, as provocações, os desafios... Tudo! Em especial, tudo o que envolve contato humano. Amo a troca que se dá nas relações, embora muitas vezes a sofra. Só consigo escrever se sou inteira no que vivo e nas relações, derramando ingenuidade a cântaros, por escolha, por recusa consciente a perdê-la. No dia em que me tornar uma pessoa “armada” ou cheia de escudos, talvez não possa mais escrever ou, no mínimo, deixe de ser poeta. Espero não me render. Corro para o abraço, acolho, e o que fica na peneira é sempre inspirador. 

3 - Existem tabus na sua escrita? Porquê?

Todos nós temos tabus inconscientes, bem como preconceitos, por mais que neguemos. Busco vencê-los e estar aberta a temas, embora me veja no direito de escolhas na escrita, do mesmo modo que escolho o que ler. E escolhas muitas vezes são confundidas com tabus, assim como conceitos são tomados por preconceitos. Estamos num mundo e momento em que a maioria pensa ser preciso fazer tudo ou falar sobre tudo para ser livre ou libertário. Mas ninguém é realmente especialista em tudo nem se deixa tocar por tudo. Não, não me vejo na obrigação de escrever sobre tudo, e isso também é liberdade. Ou ao menos é libertador! A literatura é muito mais que texto para sorrir ou entreter; muitas vezes nos faz sofrer, desconstrói, provoca, reconstrói, impulsiona... Faz diferença para além de um instante. É essa a literatura que amo e a que almejo. Jamais vou escrever qualquer coisa que objetifique a mulher, por exemplo. Porque literatura demanda responsabilidade, não é mero alimento para o ego, aberto a tudo o que atraia holofotes. Assim, a (auto)cobrança de não se ter “tabus” pode ser uma armadilha e um desserviço à literatura. Melhor a escrita genuína e autêntica, ao meu ver.

4 - Que importância dá às antologias e colectâneas?

Participo de algumas. Penso que é um bom começo, bom recurso para um escritor que por qualquer motivo ainda não conseguiu publicar seu livro. Também podem ser significativas, se bem contextualizadas ou com temática importante para o escritor. Porém, quase sempre a divulgação é fraca e elas acabam alcançando poucos leitores. Além disso, poucas primam pela qualidade; a maioria dos editores de antologias não tem muito critério para escolher integrantes, especialmente quando envolve dinheiro. Não só como escritora, mas como editora, eu me preocupo muito com esses aspectos negativos e penso que se deve dar mais atenção a eles para que as antologias e coletâneas sejam sempre impactantes e importantes.

5 - Que impacto têm as redes sociais no seu percurso?

As redes sociais têm facilitado a conexão com outros escritores e a divulgação da escrita. No caso da poesia, tem sido essencial a conexão entre poetas, visto que poeta lê poeta – ou espera-se que leia, e comenta poeta, o que se espera e contribui para o crescimento. O perigo é que o escritor só leia pela rede, ficando carente de formação mais aprofundada e de ir além da contemporaneidade. Isso muitas vezes o torna vítima de modismos, receitas prontas de “sucesso”, supervalorização da fama e de brilhar num grupo, ao menos, legando a qualidade literária a segundo plano ou a plano nenhum. Mas a troca é positiva, desde que se busque a justa medida.

6 - Quais os pontos positivos e negativos do universo da escrita?

Não somos mais os mesmos escritores nem os mesmos leitores, com um tempo diferente e uma expansão de informações mais plena, universal. Paradoxalmente, não vejo universo de nada, mas diversas bolhas que dificilmente interagem. Assim, embora haja maior alcance de formação para o escritor, com mais facilidade para pesquisa e conhecimento, há mais engodos. “É preciso estar atento e forte!”

7 - O que acredita ser essencial na divulgação de um autor?

A divulgação hoje pode se dar por diversas formas, assim como a distribuição do livro. O autor pode ser divulgado por agentes literários e se divulgar também, apresentando seu trabalho em saraus e virtualmente sempre que possível. As possibilidades são muitas, das mais tradicionais às mais criativas.

8 - Quais os projectos para o futuro?

Sou essencialmente poeta e, em minhas incursões pela prosa, sempre optei pelo gênero crônica; escrevi alguns contos também, mas poucos. Tenho como projeto e desafio a escrita de um romance. Para isso tenho buscado me preparar, com muita leitura, oficinas, estudos.

9 - Sugira um autor e um livro!

É muito difícil sugerir um único livro! Dos marcantes, sugiro “O jogo da amarelinha”, de Julio Cortázar, “Os trabalhadores do mar”, de Victor Hugo, e “Terra Sonâmbula”, de Mia Couto. Mas também nosso Guimarães, Érico Veríssimo, Machado, Clarice. Na poesia, sugiro tudo do João Cabral de Mello Neto, meu primeiro poeta-amor, Quintana, Neruda, Manoel de Barros, Bandeira, Leminski, T.S. Eliot, Cecília Meireles. Ah, não falei que era missão impossível sugerir só um?

10 - Qual a pergunta que gostaria que lhe fizessem? E como responderia?

Não consegui pensar em nenhuma. Talvez eu esteja aberta a qualquer pergunta, porque, se não puder responder, levá-la comigo é estimulante e enriquecedor.

Acompanhem, curtam e divulguem esta e outros autores através deste link

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