Diário do absurdo e aleatório
265
Não me impinjam pessoas de utópicas esperanças, grávidas de vertigens fúteis e especializadas em esturjão. Prefiro o cheiro destas páginas – genéricas das tertúlias de Montmartre – que são como geniais pautas de tangos tropeçados nos pátios da Graça, perfumados a arroz de cabidela.
Não me imponham falsas marés de fortuna, com suas ondas de fama adquirida ao preço de vénias heréticas. Prefiro o anonimato sombrio destas salas de papel reciclado, que pululam nas inúmeras Varsóvias lusas que tresandam a tabaco contrabandeado.
Não me poluam com essas histórias imberbes sobre a importância dos lugares-comuns e dos matizes de um arco-íris furtuito. Prefiro a policromia cega da consciência popular que se traduz no linguajar das guitarras harmónicas que decoram as tasquinhas e pedem cálices de ginjinha e sangria.
Não me peçam para ser contranatura e renegar José Régio. A ironia cansada dos meus olhos arrasta-me, com meu consentimento, pelos loucos caminhos da individualidade. E sigo, passo a passo, com o bolso carregado de verdades minhas e algumas de Botto, O’Neill, Ary e Ruy Belo.
EMANUEL LOMELINO
Sem comentários:
Enviar um comentário
Toca a falar disso