sexta-feira, 22 de setembro de 2023

Vida Doroteia - Joely Santiago

LIVRO GENTILMENTE CEDIDO POR IN-FINITA
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A vida cercada de pouco diálogo com a mãe fez de Dorotéia uma realista esperançosa. Ela conheceu as letras até os anos do antigo Ensino Primário. Aos quatorze anos de idade subiu no altar. Meses depois, grávida, foi abandonada pelo marido. Voltou para a casa da mãe com a barriga na goela. Graduou-se em trabalhos domésticos e, teve mais três filhas da cor da noite. Cada filha, um caso passageiro. Em casa, reutilizou os palitos de fósforos até a ponta dos dedos abrasarem. Ela tem sorriso para dias, apesar de ouvir crítica dos vizinhos: Viver minguando vida não é vida, é castigo! Faça chuva, faça sol e, Dorotéia gastara seus dias com a venda de chicletes no semáforo. Pegou encomenda de crochê e ficou até tarde da noite tecendo a linha. Quando sobrava algum tempo ela ia até a filha caçula, na época, com idade de oito anos. Chamava-se Perla. Perla passava as tardes no fundo do quintal acocada em amontoados de gravetos e latinhas de ervilha que utilizava como brinquedos. Mãe e filhas, duas gerações afastadas pelo viver da vida amontoada na pressa. Uma de suas meninas havia se maturado no sangue mensal. Ela queria conversar com a mãe sobre o ocorrido. Dorotéia não teve tempo. Por cinco décadas acumulou cansaço, varizes, calos nas mãos e carne crescida nos olhos. No mês dedicado às mães, ela foi morta na rua Princesa Isabel. Seus olhos se fecharam e deixou na terra suas sementes.

EM - ELAS E AS LETRAS: SEMENTE, PRESENTE - UM LIVRO PARA MARIELLE FRANCO - COLETÂNEA - IN-FINITA

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