sexta-feira, 12 de agosto de 2022

Tudo que é demais (não) passa... (excerto) - RITA FURTADO

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO POR IN-FINITA
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Útero acolhedor de treze filhos, dona Júlia exalava silêncios e cuidados. Mas seu silêncio tinha um propósito maior: elaborar as coisas do mundo. Exímia observadora, seu silêncio elaborava tudo que recolhia ao escutar sonoridades das palavras e dos gestos. E sua sabedoria, como a do doutor Breuer, de Brecht, não residia no fato de dominar muitos saberes, mas no fato de ser sábia a ponto de capturar e acolher os saberes fundamentais e extrair deles a essência do humano. Poucas palavras e sempre condensadas mais no olhar do que na voz. Poucas palavras e muito mais submersas no gesto do sorriso largo do que nas sonoridades vocais. Poucas palavras que exalavam o perfume na cor de seus olhos, de um verde ímpar. No enigma de seu silêncio também residiam ações solidárias (quase) invisíveis. No enigma de seu silêncio habitavam as histórias não reveladas, as dores sublimadas e as alegrias contidas. No enigma de seu silêncio morava a resiliência impulsionadora. No enigma de seu silêncio presentificavam as lições da fé inabalável num Deus divino, humano, alegre, atencioso, prestativo e, sobretudo, amigo.

EM - MULHERIO DAS LETRAS PORTUGAL - COLECTÂNEA - IN-FINITA

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