quinta-feira, 25 de agosto de 2022

O cubo (excerto) - STEPHANYE CALIXTO

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A porta imensa abriu, quis sair correndo, mas a estrutura de vidro exigia que os passos dados para fora fossem cautelosos e calculados, há meses vivia num cubo. Não um cômodo, um cubo. De vidro, sem portas e janelas, fazendo com que visse o mundo levemente ofuscado, participando vez ou outra interagindo com o lado externo, entretanto sem senti-lo... sem toque, cheiro ou qualquer sabor, nem sequer lembra exatamente quando e como foi parar ali dentro.
Tudo pareceu natural como se o cubo fosse sua verdadeira casa desde sempre, nada era tocado e tudo que não era sua própria existência ali dentro era plano distante e intocável. Em certas manhãs despertava de sonhos em que o cubo havia sido quebrado sem que os estilhaços cortassem sua pele, noutros visualizava a si mesma do outro lado e tentava quebrar o vidro com socos cada vez mais violentos que lhe arrebentavam as mãos. Comunicava-se aos gritos como se ninguém nunca escutasse direito o que dizia, fingia agradecer a sorte que tinha por estar protegida dos possíveis riscos do exterior, chorava afogando-se nas próprias lágrimas e de uma forma sombria sentia cada vez mais apego pelo vidro pois era o que lhe restava. Esforçava-se ajoelhada como se implorasse um milagre, mas nada nunca acontecia. Ouviu dizer que mercúrio voltará ao seu movimento normal e quem sabe assim um milagre, um beijo.

EM - MULHERIO DAS LETRAS PORTUGAL - COLECTÂNEA - IN-FINITA

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