quinta-feira, 17 de março de 2022

Sorte para um azar para outros (excerto) - MARIA ALIENDER

LIVRO GENTILMENTE CEDIDO POR IN-FINITA
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Era uma vez lá pelas bandas da Lagoa Dourada vivia uma família meio atrapalhada formada pelo pai, a mãe e quatro irmãos que ainda moravam na casa. A vida por aquelas bandas era vivida da forma mais simples possível. Acordavam bem cedinho com o primeiro cantar do galo carijó que anunciavam o amanhecer, estufava o peito enchia - o de ar e batia as asas para turbinar o pulmão e soltava a voz todo prepotente cocó dec, cocó dec... Seu Alvino levantava cedinho lavava o rosto se trajava todo com botas,
chapéu e ia correndo tirar o leite das vaquinhas e dona Filó também já pulava da cama pensando no que iria preparar pro café da gurizada. Dunga, Rosa e Lia mal caiam da cama já pegavam seus canecos de esmalte e iam beber o santo leitinho de cada dia no pé da vaca, engolindo ora ou outra um mosquito camuflado na espuma que o pai falava que fazia bem pra vista também, porque nunca se viu um mosquito usar óculos ele afirmava rindo. Ficavam com bigodes brancos e isto não lhes faziam mal algum. Menos a Felisberta acordava cedo porque vivia feito a Bela adormecida e era protegida pelo pai e pela mãe porque sofria de ataque epilético, não podia sentar – lhe uma mosca que os irmãos já eram punidos.

Tudo o que consumiam era produzido ali mesmo por suas mãos. O banheiro não era nada convencional, uma casinha de madeira ou mictório como assim era chamado com porta e tramela para preservar a privacidade, com um caixote também de madeira com corte triangular no centro para acomodar o traseiro na hora de fazer o “serviço” com um balde de sabugo de milho para se limparem e desses se diziam que tinha dupla função: Limpar e cosquear e para os que não gostavam que levassem folhas de mamoneira ou de cadernos velhos. Tomavam banho em um chuveiro de balde com registro suspenso por uma carretilha através e uma corda.

Eram felizes pois essa era a vida que conheciam. Nesse cenário rural, longe do agito da cidade, o franguinho caipira era abatido na hora de comer praticamente. E nesse dia especifico, por volta das 17:30 quando o sol já estava se pondo para descansar, eis que dona Filó solta a voz gritando: Dunga meu filho mate um frango pra mãe fazer a mistura da janta. O rapaz traquino e ligeiro correu apanhar a cartucheira que vivia pendurada atrás da porta da sala juntamente com o bornal de munição e não comia nada enrolado. Ele então pegou um cartucho com chumbinhos bem finos daqueles de atirar em compadre e saiu faceiro sorrateiramente para cumprir a tarefa que lhe fora designado e também louco pra comer um franguinho na panela daqueles que a dona Filó sabia fazer como ninguém.

EM - ECOS BRASIL - COLECTÂNEA - IN-FINITA 

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