domingo, 5 de setembro de 2021

Liberdade - GEORGIA ALVES

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A alteridade da terra não se fez em um dia. A lua levou milhares de anos a libertá-la do caos. Os povos buscaram equilíbrio em sobressaltos. Manadas e mamadas lutaram contra inundações. Pior, contra a seca. Trovões e raios. Fome e desesperos. Até que na costa da América. Algo mudou. Ao sul, havia água e comida. Sombra e paz. E os povos mais fortes firmaram-se com disciplina. Em humildade, plantavam e colhiam o sustento. Brotavam milhos. Nasciam os cultivos e as culturas. As celebrações. O ritmo e o som. Quebram cocos, dão as mãos. No intento, não outro, de semear e pescar alimento, seguiam sob os mitos da lua, do rio, do boto, das matas, do sol e da chuva. A floresta os ensinava a respeitar seus mistérios. Mil e quinhentas línguas faladas teriam o fim. Um elegeu o sal como riqueza, ao invés do sol. E os povos fortes viram-se fracos. Diante das lanças, do sangue, do charco. Em Olinda ergueu-se o farol do homem branco.
Em mil e duzentos metros, abaixo do nível mar existia, brotavam canas e, para além do sal, o açúcar. Somos povos que se consomem. Pernambuco, contraditório, segue em seu ritmo forte, ensimesmado, por tradição em contradição e por vocação adoçava as bocas. Neste lugar do mundo a brotar açúcares. Nascem laços rotineiros. Itinerários e mapas. Botijas, segredos. E os continentes distantes passaram a ser perto pelo mais longe. Atados ao divino interesse e ao amargo de subjugar dos homens. Em nome de Deus, Nicolau escreve a bula papal.
E impõe ao africano horrores a extradição vil. O povo forte da tez escura é levado das savanas. A mão que assinava a papel outras algema. Aos infernos dos ferros e lunduns dos navios. O a mar chorar fundas dores de cortar a cana. E a da pele que sangra brotam açúcares. Não foi pequena a luta das cores e das línguas. Das mandingas maldizendo a má sorte de todo. Pernambuco tua dor imortal ainda ecoa grosso. Estelita bem sabe da injusta condição e grita. Fraterno seja o manto que cobrirá o futuro. Supere a desigualdade e se erga em liberdade. Escreve a história por teus libertários inda que tarde.

 EM - MULHERIO DAS LETRAS PORTUGAL (PROSA E CONTOS) - COLECTÂNEA - IN-FINITA

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