Agradecemos à autora DANIELLE MONTEIRO pela disponibilidade em responder ao nosso questionário
1
- Como se define enquanto pessoa?
Eu
sou Danielle, mãe, filha, esposa, amiga, uma mulher que trabalha, que estuda,
que gosta de escrever, de ler, de dançar, de tocar violão, de desenhar e tantas
outras coisas. Sou uma pessoa apaixonada por pessoas e por histórias. Adoro
ouvir as histórias de vidas, a memória e me interesso muito por cenas do
cotidiano da cidade. Acho que nenhuma definição esgota o ser humano, mas se eu
tivesse que me definir em uma palavra, eu me definiria como uma pessoa feliz.
2
- Escrever é uma necessidade ou um passatempo?
Hoje
a escrita é algo necessário, mas não deixa de ser um passatempo, algo divertido
e espontâneo. Minha escrita retrata a minha forma de ver a realidade imediata,
o mundo sensível que me rodeia, e isso me auxilia na compreensão do que eu sou
no mundo, de como eu me relaciono com ele. Ela é sempre uma tentativa de dizer
o inaudito e isso é, eminentemente, necessário.
3
- O que é mais importante na escrita, a espontaneidade ou o cuidado
linguístico?
Acho
que falei um pouco sobre isso na pergunta anterior. Eu acredito em uma escrita
espontânea, pois é essa escrita que encontra acesso e ressonância no outro. Eu
acredito em uma escrita imersiva, profunda e autêntica. E para que essa escrita
aconteça, talvez precisemos quebrar algumas regras, algumas normas e,
especialmente, a expectativa do outro. Trata-se de escrever sem julgamento.
Quando conseguimos acessar o nosso íntimo, e isso se traduz em uma escrita
espontânea, encontramos nossas memórias, nossos afetos, a nossa melhor parte, o
silêncio que muito diz. Esse é o mergulho. Há sempre algo a dizer. É claro que
o cuidado linguístico é importante, principalmente no meio das publicações, mas
o essencial na escrita é seu poder transformador e isso só acontece quando se é
espontâneo e verdadeiro.
4
- Em que género literário se sente mais confortável e porquê?
Eu
acabei de terminar o doutorado, então a escrita acadêmica faz parte da minha
vida. Eu sou escritora no blog científico e escrevo artigos acadêmicos. Mas,
nas artes, se é que posso dizer assim, eu escrevo poemas, crônicas e ensaios.
Até hoje escrevi apenas um conto, e ele não é o meu texto preferido. Meu livro
Avesso é de poemas. O segundo também será apenas poemas. Os versos me encantam
pelas diversas possibilidades que eles carregam, tanto em relação à forma como
na interpretação subjetiva, de encontro com o outro.
5
- O que pretende transmitir com o que escreve?
Na
realidade, eu não foco na transmissão. Acho que isso acontece no processo de
acesso a meu conteúdo. A ressonância de minha escrita se dará de forma
subjetiva e singular e eu penso que o escritor não tem controle sobre isso. Uns
vão se reconhecer ali, outros não. E está tudo bem. A mensagem que quero passar é sobre as
possibilidades da escrita. Eu acredito que todos escrevem, em diferentes
níveis, mas todos escrevem. E a escrita pode ser transformadora, pode ser
restaurativa e auxiliar na construção do sentido. Então, o que eu pretendo
transmitir é “simplesmente, escreva”.
6
- Quais as suas referências literárias?
Nossa,
são muitas. Vou falar das referências atuais, que têm me afetado especificamente
nesse momento, pois os clássicos sempre nos afetam e sempre serão referências
para os que gostam de ler e escrever. Mas, atualmente, tenho lido muito os
livros de Valter Hugo Mãe, que é um português fenomenal. Tenho me dedicado a
obra de Maura Lopes Cançado, que é uma escritora nascida em Minas Gerais (Brasil),
e que escreveu um diário sobre sua permanência em hospitais psiquiátricos. E
uma outra grande escritora que tem me afetado de maneira ímpar com a forma
simples e sensível de sua escrita é Carolina Maria de Jesus, que para meu
orgulho, também é mineira. Acho que esses três, nos últimos meses, são os autores
que mais me afetaram e que, de alguma forma, tem referenciado não somente minha
escrita mas a forma como olho para o mundo e o percebo.
7
- O que acredita ser essencial na divulgação de obras literárias?
Acho
a divulgação uma parte muito difícil. Mas hoje, no contexto que vivemos, a
utilização da internet tem sido fundamental. Penso que espaços como este que
vocês oferecem são essenciais para que possamos divulgar nosso trabalho. Fora isso, as redes sociais tem sido um meio
importante de troca, de acesso e de conhecimento. Mas, particularmente, eu acho
difícil.
8
- O que ambiciona alcançar no universo da escrita?
Eu
quero apenas colocar minhas palavras no mundo, pois minhas palavras são, de
certa forma, um pedaço de mim mesma. Eu não espero reconhecimento, muito menos
ganhar algum dinheiro com isso. Mas eu sei que minhas palavras encontram
ressonância em algumas pessoas e isso já é suficiente. Eu adoro escrever, eu
gosto do que eu escrevo e não ser uma escritora me autoriza a escrever de forma
livre e leve. Isso é mais que o suficiente para minha existência enquanto alguém
que gosta das palavras.
9
- Porque participa em trabalhos colectivos?
Primeiro
porque eu acredito na força do coletivo. Eu acredito muito no trabalho
compartilhado, dividido. Há apoio nos trabalhos coletivos e isso nos tira da
solidão. Depois é uma forma economicamente viável de publicar os textos. E é
muito interessante o retorno que recebemos dos outros autores, todos sempre
muito solícitos. As editoras também fornecem apoio e auxiliam na divulgação do
trabalho, o que é fundamental.
10
- Qual a pergunta que gostaria que lhe fizessem? E como responderia?
Por
que o Brasil tem vivenciado uma realidade conturbada? Eu lhe responderia que é
porque lemos pouco, porque investimos pouco na educação e, com toda certeza, a
educação é a forma mais potente e eficaz de transformar a realidade. É por isso
que eu acredito em uma escrita simples e acessível. Simples não significa
simplória, muito pelo contrário. É por isso que tenho investido meu tempo na
leitura do que escreveu Carolina Maria de Jesus, uma mulher além de seu tempo e
que denuncia através de sua escrita o contexto brasileiro. Lendo ampliamos a
nossa leitura sobre nossa realidade e, consequentemente, sobre nós mesmo
enquanto agentes responsáveis pelos processos de mudança tão necessários.
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