sexta-feira, 24 de abril de 2020

Em tempos de quarentena - REGGINA MOON



Crônica para uma tarde de Abril ( I )

"Observo ao longe a liberdade estática relembrando planos e passados. O futuro escrevo aos poucos, cautelosamente, como neste exato momento. Há tempos não uso meu vestido preferido e meu batom vermelho. O céu resplandecendo azul é quase um desacato diante da minha janela. Mas ele ainda está ali, nos tornando a mais pura insignificância diante da magnitude de uma ameaça desconhecida. Mas hoje vim falar das flores, contrariando todo o contexto. As azaleias continuam florescendo nos jardins suspensos ao redor do mundo, um norte, um sopro de esperanças. Os corações solidários, a renúncia à própria vida em gestos de bravura, incansáveis almas a socorrer o próximo, a comunhão, a luta obstinada rumo a cura. Enquanto isso o mundo aguarda, inerte, que pessoas de luz tomem a frente, que exerçam o poder de todo conhecimento científico adquirido para vencer essa batalha. Muitas coisas poderiam ter sido evitadas se a humanidade não fosse assolada por sentimentos menores, que considero um dos piores contágios existentes. É hora de continuar, de orarmos do nosso jeito, de nos "religarmos a Deus", literalmente, no real significado da palavra "religião", de respondermos bom dia e deixarmos as mágoas e ressentimentos sob uma pedra no passado. Eles não existem mais, nada será como antes, uma nova era se inicia, contra a nossa vontade ociosa de ir vivendo a vida. Plantaremos mais flores, o céu estará mais azul, a poesia de cada momento se fará presente no coração dos que compreenderam a brevidade de tudo, a urgência de saudarmos a vida contida na eminência do fim, a alegria de estarmos aqui e a força das almas do bem espalhadas pelo planeta dando um show de solidariedade. Se para muitos o tempo irá terminar importa o que levará desse tempo, desta permanência. E aos sobreviventes restará a grande e nobre missão de amparar a terra castigada e colher pelos campos as azaleias cultivadas."
Reggina Moon

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