domingo, 26 de abril de 2020

DEZ PERGUNTAS MULHERIO DAS LETRAS PORTUGAL - GRAZIELA BARDUCO


Agradecemos à autora GRAZIELA BARDUCO pela disponibilidade em responder ao nosso questionário

1 – Qual a sua percepção para essa pandemia mundial?

Eu sempre parto do princípio de que somos seres totalmente adaptáveis a toda e qualquer situação a qual somos apresentados. Desta forma, deixando de mencionar minha preocupação com o momento atual que estamos vivenciando, passei a vislumbrar, com muita admiração, toda a criatividade empregada neste ensejo, para que cada qual pudesse permanecer são e ativo em meio a esta nova realidade.

2 – Enquanto autora, esse momento afetou o seu processo produtivo? Em tempos de quarentena, está menos ou mais inspirada?

Inicialmente me vi um tanto travada em meus processos de criação. Depois, com o passar do tempo, bem como já devidamente mais adaptada a nova rotina, o turbilhão de ideias foi aos pouquinhos retornando, de modo que, nas últimas semanas, ele passou a aflorar-se com mais afinco.

3 – Quando isso passar, qual a lição que ficou?

A meu ver, a maior lição terá sido a grande certeza de que tudo aqui é efêmero, sobretudo nós mesmos.

4 - Os movimentos de integração da mulher influenciam no seu cotidiano?
Influenciam demais, desde que me lancei neste caminho da literatura. Tenho uma profunda gratidão pela acolhida das companheiras de escrita, as quais fui encontrando no decorrer desta trajetória que se desenha, bem como uma profunda alegria pela possibilidade de conhecer tantas mulheres guerreiras e inspiradoras.

5 – Como você faz para divulgar os seus escritos ou a sua obra? Percebe retorno nas suas ações?

Em geral, lanço mão ao artefato das redes sociais. Nem sempre o retorno é aquele que sonhamos, mas a possibilidade de poder estar em contato, mesmo que virtualmente, com tantas pessoas, dos mais diversos lugares, e, por meio deste contato perceber que um texto seu tocou de alguma forma alguém, acaba sendo o suficiente para me alimentar a alma e estimular cada vez mais minha criação. Outro recurso que tenho usado muito é a colagem de lambe lambes por diversos locais pelos quais vou passando, com algumas de minhas quadrinhas ou sextilhas. Nem sempre eles duram muito onde são colados, mas quando recebo alguma foto ou menção sobre estes lambe lambes, de alguém que por eles passou e decidiu registrar, sinto um intenso viço tomar conta de mim. 

6 - Quais os pontos positivos e negativos do universo da escrita para a mulher?
Positivos ainda estou por descobrir, risos. Mas, brincadeiras à parte, ainda estamos sujeitas, dia a dia, a um preconceito esmagador, inerente ao contexto social no qual estamos inseridas. Acredito que esta é uma luta que vem sendo travada há muito tempo e penso que ainda há muito pelo que se batalhar.

7 – O que pretende alcançar enquanto autora? Cite um projeto a curto prazo e um a longo prazo.

Normalmente eu não costumo fazer tantos planos a longo prazo, sou mais de viver intensamente o presente, bem como desfrutar um dia de cada vez. No momento estou trabalhando em um novo projeto, que é o da elaboração de um livro infantil, sendo este o meu primeiro desta vertente, já que meus livros anteriores foram de poesias. Eu estou no processo de adaptação da dramaturgia do espetáculo mais recente de nossa cia. teatral infantil, de modo a transformá-la em um romance para crianças. O livro se chamará "A Menina e o Pé" (assim como o espetáculo) e aborda, de maneira muito lúdica, diversos elementos da cultura popular brasileira. A ideia era lançá-lo ainda neste ano, porém, por conta da pandemia, não sei ao certo como ficará nosso novo planejamento.

8 – Quais os temas que gostaria que fossem discutidos nos Encontros Mulherio das Letras em Portugal?

Talvez fosse interessante desenvolver uma abordagem acerca da poesia popular brasileira, fazendo um passeio por suas formas e estruturas tão ricas e peculiares, inclusive podendo apontar a forte influência ibérica nelas encontrada.

9 - Sugira uma autora e um livro que lhe inspira ou influencia na escrita.
A primeira autora que me vem a cabeça é a querida Jarid Arraes, que inclusive fez as honras de prefaciar meu livro mais recente. Sou extremamente apaixonada pela forma como ela arquiteta e elabora seus textos e aficionada por seus cordéis. O último livro dela, o qual tive a alegria de ler foi o “Redemoinho em Dia Quente”. Eu digo que ele é primoroso na medida em que dá voz a diversas personagens femininas, expondo e abordando temas pesados, por assim dizer, de modo a fazer, a meu ver, um belo e perfeito equilíbrio entre o caos e a calmaria. Ao entrarmos em contato com as respectivas personagens, é possível sentirmos, como que na alma, suas dores, temores, amores, alegrias e expectativas, de maneira a ficarmos quase que inebriados pela pura essência de cada uma delas.

10 - Qual a pergunta que gostaria que lhe fizessem? E como responderia?

Eu gostaria de pedir licença para falar um pouquinho do meu último livro, o "Lutei Contra 100 Leões – Todos os 100 Eram Jumentos”, lançado pela Editora Feminas, no início deste ano, antes de a pandemia nos acometer. Ele faz uma homenagem aos poetas, cantadores, romanceiros e repentistas da cultura popular brasileira, utilizando as formas e estruturas encontradas na poesia popular brasileira, porém fazendo uma espécie de ressignificação da mesma ao trazê-la para um contexto mais próximo do cotidiano urbano no qual estou inserida, bem como aproximando de um universo mais feminino, toda a temática nele abordada. Ele brotou em um momento em que eu me via um tanto sufocada por comentários e críticas negativas com relação ao que vinha produzindo, porém, aos pouquinhos fui observando que tais apontamentos, em sua grande maioria, vinham de homens e alguns deles até mesmo me desencorajando a continuar em meu caminho de escrita que vinha se desenhando. Eu cheguei a ficar um tempo travada, o que me fez muito mal, já que a escrita tem me servido principalmente como válvula de escape das mazelas da vida, de modo que não conseguir escrever era um suplício gigantesco sendo aplicado na minha alma. Foi então que surgiu o poema/décima "Lutei Contra 100 Leões - Todos os 100 Eram Jumentos", como forma de resposta a tudo isso que eu vinha sentindo. A partir dele, surgiu a ideia de encabeçar o livro (homônimo ao poema), para que eu entendesse, de uma vez por todas, que ninguém jamais será capaz de conseguir me calar.

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