LIVRO GENTILMENTE CEDIDO POR IN-FINITA
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Seriam aí pelas três da manhã e o pequeno Miguel dormia profundamente o sono dos cinco anos, sono bem fundo, mas que paradoxalmente permite sonhos. Sonhos fantásticos livres de recordações de dor. Sonhos puros como a mente que os suportam.
Mas de repente, um trovão enorme suou e estremeceu a casa e cama onde dormia. Como criança não despertou completamente, mas o suficiente para começar um sonho que só as crianças podem ter.
Mas tão forte era o sonho que o Miguel, hoje com idade de juízo, pergunta-se se realmente foi sonho, tão nítidas são as imagens e as pessoas na sua memória e no seu presente.
É no suposto que foi mesmo sonho que tudo o que se segue tem a sua origem.
Começa no sonho do Miguel, por sentir-se algures vindo de um Alto que desconhece e ver abaixo dele um espesso e bonito manto que parecia lã, da mais elevada pureza e brancura. Repara que esse manto branco é algo de móvel e sensível a qualquer força, pois movimenta-se dançando ao som de uma ligeira brisa. Miguel soprou e reparou que o manto branco não era mais que nevoeiro
que se desfazia por acção do ar quente da sua respiração. Miguel soprou mais ainda e um buraco se abriu mostrando que sob o nevoeiro havia terra. E à medida que soprava mais se abria o manto
e se viam mais casas, mais caminhos, mais flores. Apareciam aves voando e até conseguiu ver um policromado pica-peixe que voava ao longo de um rio. Rio em que uma cascata de água límpida
cantava como uma sereia que estivesse aí encantando e seduzindo homens para o mar.
Miguel achou-se num paraíso perante tanto encanto. Mas de todas as maravilhas que viu uma viria a ter importância especial, pois deu nome à aldeia. Vários bandos de Astures pequenos, acompanhados pelas mães, ensaiavam os seus primeiros voos. Que quadro magnífico! Subiam, desciam, rodavam, planavam e esvoaçavam, tudo numa sincronia própria de bailarinas profissionais, tais eram as mães a ensinar os pequenos astures a voar. Ora bem: A junção do Asture com Mães veio dar o nome a esta aldeia ou, se quisermos, a este paraíso: ASTURÃES, assim dizem os mais velhos habitantes.
É nesta aldeia e freguesia que se passam as coisas extraordinárias que o sonho do Miguel criou.
O seu sonho não se passa num dia, mês, ano ou geração: ocupa várias e indefinidas gerações.
Este sonho é apenas a circunstância da época vivida.
EM - MIGUEL, NO EXTREMO DA ESTREMA - ERNESTO FERREIRA - IN-FINITA
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