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Pés na areia, carinho. Em busca do farol vai ao mar uma solista navegante. Gestos de suprema festa encontram espumas largadas pelo mar. Toca-se do umbigo ao púbis, das areias às ondas do mar. Silenciosamente, põe a canoa para beber das vagas densas e límpidas. Só... mais sal, mais toque. De dedo em dedos assume o leme uma capitã pronta a remar. Vai, depois de uma cambiante solidão, içar a vela. Lençóis? Ondas do mar? Tudo velado; farol sua rota pelos intrigantes segundos do desabitar.
Desejar. Tocar. Sentir. Caçar. Achar. Despe-se de medos ingênuos, joga-se pelo úmido caminho do mar. Queria aqui, sentir cheiros, toques e fremir meus olhos ardentes, fazendo pios no silêncio e deixar pra lá o que faz a vida, as vertigens, os medos, a bobeira intensa. Deito-me longamente no silêncio. Aninho-me. Uma mão invasiva acha meu corpo condescendente.
─ Há um vizinho te olhando pela janela do prédio ao lado.
─ Levanta-te, cobre-te. Não se doe tão facilmente. Feche a janela; quem quiser que te ache, que te ganhe.
Impudica. Devassa. Indecente. Calor intenso, tudo acontecendo ao mesmo tempo. Medo de perder-se ante aos conservadores da moral e dos bons costumes. Foi, feito santa antiga, comungar-se diante de um padre carnal demais para não notar as faces rosadas e trementes e o total frenesi do seu corpo.
─ Acalme-se minha filha, coisas da vida, coisas da carne. Acalme-se, já isso passa.
─ Pago penitência, padre?
─ Bobagem, compre uma camisinha!
Foi-se lambendo o desejo feito cão de rua, escondendo-se feito moça de antigamente com medo do sacrilégio, do olhar do chefe, das maldições e dos descaminhos da vida.
Olhar-me? Ver-me? Ante a cegueira que me esconde, luz pra quê? Vejo-me com o toque, com o tempero ocre doce que me arde. Saio das areias e entro no mar. Há, lá longe, uma pequena canoa, remos soltos, rumo ao farol que faz o caminho brilhar.
─ Acha-te. Feche os olhos e guie-se. Seja cálida, intensa e festiva.
EM - MULHERIO DAS LETRAS PORTUGAL (PROSA E CONTOS) - ANTOLOGIA - IN-FINITA
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