Agradecemos ao autor ESTEVÃO MACHADO pela disponibilidade em responder ao nosso questionário
1 - Como se define enquanto autor e pessoa?
Acredito que esses dois entes se misturam o tempo todo
– autor e pessoa. Como pessoa, me vejo, e de fato atuo, em vários territórios –
sou arquiteto, escrevo artigos em periódicos, sou músico, compositor. Talvez,
por não ter uma produção expressiva em quantidade na poesia – estou na
elaboração do meu primeiro livro, chamado “Antemanhã” – essa produção
incipiente acaba deixando, em mim, certa indefinição como autor. Esteticamente,
me encontro com os versos livres, procurando criar células rítmicas, de 7,8 e 9
sílabas... Variando o tamanho/forma do poema. Tateando na busca de ritmos e
imagens com a musicalidade das palavras. Antemanhã é um projeto que também
abraça a música (é um disco com canções e um livreto com poemas). É um trabalho que existe como uma metáfora do despertar do dia, como um
despertar do homem com as coisas que parecem estáticas, imutáveis, mas que
sutilmente nos sugere mudanças, como o dia-dia muda e se reapresenta para nós.
Acho que essa aproximação da canção e do verso, da musicalidade da palavra no
poema e o significado expressivo do verso na canção fazem parte do meu
amanhecer, diariamente. Sempre tentando aprender...
2 - O que o inspira?
O que tem me inspirado é a
memória... a minha e a dos outros. Gosto de entender como as pessoas guardam o
que lhe afetam. Isso me aproxima delas e das coisas do mundo que merecem sempre
nossa observação. O “conhecer” pessoas, lugares, coisas, pensamentos...tudo
isso tem proporcionado inspirações.
3 - Existem tabus na sua escrita? Porquê?
Acho que as expressões
artísticas não devem ter tabus. O século XX pavimentou o terreno para que hoje
nós possamos transitar pelas linguagens da arte de uma maneira prosaica mas ao
mesmo tempo trazendo referências externas e temporais de muitos lugares e de
conteúdos diversos. A literatura, seja em prosa ou em verso, não deve caminhar
de forma diferente.
4 - Que importância dá às antologias e colectâneas?
Tem um papel fundamental na
aproximação de estilos e visões artísticas dos escritores. Mais do que uma
coleção, ela contribui para que os leitores possam identificar escolas,
estilos, traços estéticos de novo-velhos autores e muitas vezes acabam fazendo
elos muito ricos entre os autores e suas escritas.
5 - Que impacto têm as redes sociais no seu percurso?
Nesse pequeno trajeto
chamado “meu percurso” rsrsrs ...as redes sociais tem se apresentado como uma
grande ferramenta de disseminação e aproximação do que produzo. Embora essa
efetividade com a distribuição da arte, possa se dar sem “atravessadores”
dentro das redes sociais, me parece que o papel da comunicação (digital) sempre
será pertinente. Espaços de debates são muito necessários... Não como um crivo
do que deve ou não deve ser lido, ouvido ou assistido, mas como espaços de
reconhecimento dos valores estéticos da arte.
6 - Quais os pontos positivos e negativos do universo
da escrita?
Engraçado... Eu nunca parei
para ponderar o que há de positivo ou negativo. Essa pergunta me fez lembrar um
escritor de Alagoas, radicado em Pernambuco desde os anos’60 chamado Ângelo
Monteiro, quando ele diz: Para que
público morto, fala hoje a poesia? Acho que é uma pergunta que se
reafirmará por muito tempo enquanto vivermos nessa “ditadura da imagem”. A
poesia ficará sempre com um papel de reafirmação da nossa natureza, já que
talvez seja a forma de expressão artística que menos modificou sua ferramenta
de produção: a escrita. Somos as únicas criaturas que conta a sua própria historia,
ultrapassa seus próprios receios e alimenta seus próprios sonhos. Se existe
alguma outra que sabe sua história, seus receios e seus sonhos, tenho certeza
que não escreve sobre elas rsrsrs
7 - O que acredita ser essencial na divulgação de um
autor?
Acredito que a
transparência nas informações das biografias, do trabalho em si...mas,
sobretudo uma capacidade de criar elos entre o autor e escolas literárias,
outros autores e etc. Como falei anteriormente, parafraseando (ou melhor “paraverseando”
Ângelo Monteiro), a literatura, principalmente no Brasil – não sei em Portugal
– é uma arte de difícil acesso para o público em virtude do pouco habito de
leitura das pessoas. Leitura literária... As pessoas leem muito textos avulsos,
opiniões avulsas... Acessam artes das mais variadas em shows, espetáculos... Mas
a leitura silenciosa, essa tá cada dia mais difícil. Então não é raro, que o
escritor muitas vezes seja colocado como um “ser notável” que se distingue dos
demais... Não acho isso positivo. É preciso, não só no papel de quem divulga,
mas de quem edita, de quem escreve e do próprio autor, assumir uma necessidade
de que hoje, no Brasil, precisamos formar leitores. Formar crianças, jovens e
adultos sensíveis à literatura. Através de coletivos, saraus públicos, projetos
nas escolas, nos trabalhos e etc. É um desafio...
8 - Quais os projectos para o futuro?
Continuar escrevendo e tentar fazer algum trabalho que una música e poesia.
9 - Sugira um autor e um livro!
Um dos grandes escritores
da nossa língua portuguesa, pernambucano da cidade de Jaboatão dos Guararapes, Alberto
da Cunha Melo. Eu recomendaria Yacala, lançado em 1999. E na literatura de
língua não portuguesa, Ítalo Calvino e suas Cidades Invisíveis.
10 - Qual a pergunta que gostaria que lhe fizessem? E
como responderia?
O que é a liberdade,
Estevão?
A liberdade é o encontro da alegria com o medo que faz
girar a nossa roda do tempo para movimentar, semear, emergir e refletir em nós,
o prazer e o temor de que as coisas que nos cabem, estão todas no mundo.
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