ESCRITA DE QUALIDADE
O que
define a qualidade da escrita? O estilo? A técnica? A mensagem? Independente do
género literário, quais os predicados necessários para se ser um bom escritor?
Por vezes
dou por mim a reflectir neste tema muito por culpa da minha condição de autor
que me "obriga" a fazer sempre melhor do que já fiz. É precisamente
nessa busca de aperfeiçoamento que me surgem estas dúvidas e creio que todos
aqueles que escrevem também sentem, amiúde, essa necessidade e fazem a mesma
reflexão.
É
evidente que cada um de nós tem o seu próprio conceito de qualidade e o
utilizamos para separar o trigo do joio, o mesmo é dizer, o que gostamos daquilo
que achamos menor. Mas quererá isso dizer que não existe qualidade no que
rejeitamos? Creio que não e para justificar esta minha posição uso como exemplo
o único livro que até hoje não consegui ler na totalidade (Versículos Satânicos
de Salman Rushdie). Não o fiz porque não gostei da forma como a história se
desenrolava e o estilo do autor não me conseguiu cativar. Ora, tendo em conta
que estou a falar de um dos livros mais polémicos e conhecidos da história da
literatura, não creio que o facto de eu não ter gostado seja sinónimo de falta
de qualidade do autor, um best-seller por excelência.
Aqui
chegados, tenho de dizer que, a simples condição de best-seller, também não me
garante a qualidade de um livro. Quem não leu já um grande livro de um autor
praticamente desconhecido? Tenho a certeza que quase toda a gente tem em casa
pelo menos um livro que considera fantástico e que muitos desconhecem a
existência! Dou-vos como exemplo (tenho tantos) O LIVRO QUE DESCEU DO CÉU de
AHMAD ‘ABD al-WALIYY VICENZO. Alguém conhece?
Por outro
lado, muitas vezes alguém nos sugere um livro dizendo mil maravilhas do autor
ou da obra e depois de lermos ficamos com a sensação de termos sido enganados
(normalmente acontece quando damos ouvidos aos críticos literários).
Aproveito
para fazer um curto parentesis e falar um pouco da forma como muitos críticos justificam
a qualidade de um livro. Dando como exemplo a poesia (vai-se lá saber porquê)
não concordo com critérios de avaliação apenas técnicos tanto mais que quando
estou a ler um livro de poesia não estou propriamente preocupado com a métrica
ou com o estilo. A mim dá-me muito mais gozo ler o livro pela mensagem e pelo
ritmo. Não andarei muito longe da verdade se disser que quem já leu a poesia da
Florbela Espanca adorou os poemas apesar de desconhecer se os sonetos são
decassilábicos, alexandrinos ou clássicos. Esses pormenores da escrita devem
ficar para análises mais académicas e laboratoriais. Não estou a dizer que
estas características sejam futéis para o leitor, apenas quero dizer que a
qualidade deve ser vista num todo e não somente por aspectos técnicos
pontuais.
Para
terminar e retomando o fio à meada, chego à conclusão que a definição de
qualidade, no que à escrita diz respeito, é demasiado lato e inconclusivo uma
vez que os padrões diferem de pessoa para pessoa. Contudo, não deixa de ser
verdade que existe muito livro mau e isso, quanto a mim, deve-se mais a falta
de qualidade criativa.
MANU
DIXIT
Olá!
ResponderEliminarA sua reflexão sobre a qualidade fez-me lembrar uma discussão, numa aula na faculdade, sobre o que seria ou não literatura. É um tema fascinante que toca, como é obvio, as questões da qualidade da escrita e da diferença entre autores e escritores. Nessa altura, chegámos à conclusão que cada um de nós tinha opiniões diferentes sobre o assunto e que todas elas se relacionavam com as nossas preferências, com o que apreciávamos na escrita, e não propriamente com considerações técnicas. É um assunto que, para além de muito útil para quem escreve e para quem estuda literatura, nos dá a conhecer as pessoas através dos seus pontos de vista, o que, para mim, é ainda mais interessante. :-)
Marta Teixeira Pinto
Marta! Na literatura, como em muitos aspectos do dia-a-dia, creio que a qualidade tem mesmo que ver com gostos pessoais. E como somos todos diferentes...
EliminarObrigado pela visita!
Ora aí está um texto sobre o qual devemos meditar e tirar as nossas próprias conclusões. Os gostos de cada um diferenciam-se e muitas vezes há segundos sentidos em determinadas avaliações.
ResponderEliminarAcabei de ler "Jardim das Delícias", de João Aguiar. Será que muitos conhecem esta obra? Apesar da temática não ser aquela que mais gosto de ler, tive de concluir que o enredo ficcionado desenvolve trâmites que nos fazem lemvrar tanta coisa e imaginar muitas outras do futuro da Humanidade e da política utilizada nesse desenrolar. E quando falo no (escrevo) futuro, refiro-me ao duturo desde o culminar da obra pelo respectivo autor, que ditada em 2005, pela ASA, já havia sido escrita tempos antes.
Li, recentemente, dois livros de índole histórica, um mais ficcionado que outro, que gostei muitíssimo. Vejam se já os leram: "A Demanda do Mestre", de Isabel Ricardo, da Planeta Editora e "O Ouro dos Corcundas", de Paulo Moreiras, da Casa das Letras, se os puderem ler certamente gostarão, ou não?
É bom sempre ler o Emanuel Lomelino nestas questões deveras pertinentes.
Meu abraço.
Poeta! Obrigado pelo testemunho que só vem enriquecer este blogue.
EliminarForte abraço.
O gosto comanda tudo o que fazemos. Gosto de escrever. Gosto de ler e tal como refere há coisas que considero fantásticas mas que quase ninguem conhece. Não sou escritora nem poeta. Escrevo o que sinto (por vezes poemas poemas sem olhar a estilo ou a forma) sem ter a preocupação de agradar. Procuro que tenham qualidade mas uma qualidade que é atribuida por mim mesma e que por isso poderá não ser considerada por outros. No que leio sou eu quem atribuo a qualidade. Aprecio uma boa escrita num português cuidado e bem estruturado mas não é essa a minha bitola de qualidade. No entanto tenho lido coisas com muita qualidade apesar do anonimato dos seus autores.
ResponderEliminarAdelina! Realmente a qualidade é definida por cada um de nós e existe tanta qualidade no anonimato!
EliminarObrigado pela partilha de opinião.
Adorei teu texto. Quando escrevo minhas poesias, preocupo-me apenas em passar sentimento, pois quero que o leitor mergulhe nas minhas palavras, que as sinta penetrar no seu coração, que faça com que sinta deseja, sinta saudade enfim, quero que ele se identifique com o que lê. Estou querendo muito não é? Pode ser, mas é isso que procuro quando leio uma poesia, um romance... A propósito, sou apaixonada por Florbela Espanca, tenho 3 livros de sonetos e leio e releio sempre. Parabéns pelos blogs, estou seguindo todos. Sucesso pra ti.
ResponderEliminarhttp://poesiasesonetos.blogspot.com.br
Nádia! Obrigado pela visita e pelo testemunho. O propósito deste blogue é precisamente falarmos de assuntos relacionados com a literatura e assim trocarmos ideias e experiências.
EliminarO gosto é o assunto mais discutível que existe, ser bom ou ser mau tem sempre como ponto de partida uma opinião pessoal. Já li livros recomendados que não me agradaram em nada. Já li muitos autores desconhecidos que adorei e reli. Também já li um livro de um certo autor que adorei e procurei outro do mesmo autor que não gostei.
ResponderEliminarQuando os críticos colocam um rotulo num livro há mil manobras por de trás disso, e muito poucas vezes é "qualidade". Basta ver que qualquer figura publica edita um livro e logo vendem milhares e o conteúdo? pois quase sempre vazio.
Temos um autor português que foi prémio Nobel e eu não gosto assumidamente, mas não gosto porque li e tirei a minha opinião. Sim, porque há quem diga que gosta muito deste ou daquele e nunca o leu!
Quanto à poesia é ainda mais aberto o leque de gostar ou não, pessoalmente gosto das mensagens e da envolvência, se rima ou tem silabas cruzadas pouco me interessa. Perdeu-se muito boa poesia nos séculos passados por causa desse preconceito, que poesia é rima e silábica contada ao "milímetro". E ainda hoje há quem assim pense e critique quase sempre nos bastidores porque dar a cara é algo que não sabem fazer.
Resumindo eu gosto de gostar daquilo que gosto pelo meu gosto e não pelo que devo gostar!
Um bom artigo, meu amigo
beijinhos
E gostos não se discutem!!!
EliminarParabéns Manu por este tema que como outros anteriores, tão pertinentes são.
ResponderEliminarNão há muito tempo, "discuti" precisamente este tema com um grande autor português. Dos grandes mesmo, mas alguém simples no ser e estar.
Ele tinha a ideia de que presentemente a maioria do que é editado é má qualidade. Seja em poesia, seja em prosa. Aí fiz-lhe a pergunta: o que é para ti qualidade na liletratura? Deu a sua opinião, com a qual concordei em alguns pontos. Noutros não. Para que ele melhor entendesse, perguntei: o que era para ele música de qualidade. Respondeu, não vou aqui citar as preferências, pois não pretendo identificar a pessoa em questão.
Pegando na música... para muitos boa música é a erudita, ou clássica, ou jazz, ou... ou... ou... Assim não se pode dizer com precisão o que é boa música. Pessoalmente, num dia posso sentir somente vontade de ouvir música clássica. Noutro, qualquer outro tipo... Não por uma para mim ser de mais qualidade do que outra. Mas pelo meu estado de espírito. Assim, deve de existir um leque variado, para a mesma chegar a todos. Se existe má qualidade em muitas música? Claro que sim.
Pegando no caso da literatura... Como a música é cultura e a cultura tem de chegar a todos a todos.
Assim, será sempre subjectivo o ser de qualidade ou não. Leio poemas de grandes poetas, com tudo certinho no que toca às regras, à técnica e nada me diz. Vejo sim essa perfeição, a escolha de palavras com mestria... mas não se entranha, não chega a mim. Romances ou outro tipo de prosa... o mesmo acontece. Existem livros, que por mais de uma vez iniciei a sua leitura, no entanto não consigo ultrapassar dum certo número de páginas. Outros há, de autores sem nome, que de imediato me cativam e me levam a querer ler, mais e mais.
Igualmente na leitura, existem fases que nos permitem ou não ficar cativados. Pessoalmente tenho fases em que necessito de livros complexos, que me façam pensar... outras mais suaves e outras até... livros do tio Patinhas.
O que boa literatura? Não é mensurável por ser subjectivo. Existe livros espectaculares para mim, de autores consagrados ou quase anónimos... no entanto, ao ler tenho a perfeita noção de que só atingirá uma camada de quem lê. Seja pela terminologia usada, pelas palavras e frases muito elaboradas...ou por outros motivos que não alcançam uma faixa da população. Torna-se imperceptível para muitos. Mas que para mim tem muita qualidade.
A cultura, não pode ser elitista... a cultura deverá ser acessível a todos.
Assim, mantendo o que o Manu diz acima,: gostos não se discutem, acredito que só existe vantagem na diversidade da mesma.
Não sou escritora nem poeta, é algo que continuo a afirmar e mais a sentir como plena verdade. Escrevinho nada mais. Sentires, de forma simples e despretensiosa. Nada percebo de métricas nem de técnicas. Escrevinho da forma que sou: com palavras simples. Quantas vezes tentei melhorar, colocando palavras mais elaboradas, mais ricas. Não por teimosia, mas volto sempre à forma original. Porquê? Porque ao ler após essas "melhorias", deixo de sentir o que escrevo como "meu". Passa a ser algo trabalhado, para outros. Deixam de ser as emoções que espontaneamente liberto de dentro de mim.
Assim digo, mais simples, mais tratabalhado, com ou sem regras... cabe a quem lê sentir que é bom e com esse sentir, passa por ter sido cativado.
Muitos há que lêem um livro, best seller ou não, dum grande autor com excelentes críticas... e, não gostam, ou mesmo nem o conseguem ler, mas não têm a coragem de o dizer. Têm medo de serem considerados menos cultos.
Com quem "discuti" e referi acima, acabou por me entender.. e referiu, que na verdade muitas vezes "a visão do que é boa literatura" tem uma amplitude muito estreita e que sim, acabam por ser elitistas... sem na realidade o serem. É o ver algo só de um ângulo.
Que tenhamos visão abrangente e, que é fundamental existirem "diversos tipos de qualidade", a fim de chegar a todos.
Beijinhos,
Susana
Susana! Não podia estar mais de acordo.
EliminarBeijo.
Boa noite Emanuel.
ResponderEliminarOra aqui está um tema interessante.
Para mim um bom livro, independentemente do seu género, é aquele que o leitor sente, lê, volta a reler e descobre sempre alguma coisa que numa primeira leitura lhe escapou.
Resumindo um bom livro é um livro que um leitor sente.
É essencial sentir as palavras do livro e isso faz a diferença entre ler meia dúzia de páginas ou ler e reler.
Beijo amigo daqui.
Maria José Lacerda
Maria José!
EliminarNo fundo a qualidade resume-se a isso.
Obrigado pela visita.
Beijo.