sexta-feira, 31 de julho de 2020

Rodoviária - YVONNE MILLER

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Boa noite, pessoal. Desculpem incomodar vocês. Eu sei que é chato, sei que não sou o único, que não sou o primeiro e nem serei o último a pedir a sua ajuda.
Atenção, por favor. O ônibus para Recife com saída às 22:30 está prestes a partir da plataforma 13.
Caixinha de som, fone de ouvido, capa protetora para seu celular, pau de selfie, caneta azul?
– Não, obrigada.
Só peço um pouco da sua atenção. Meu nome é Antônio. Sou daqui não, mas lá do Piauí. Vim aqui tentar a sorte e tudo deu errado.
Por favor, mantenha seus bens perto de você. A Rodoviária de Fortaleza não se responsabiliza por objetos perdidos.
Espera, Joãozinho! Não vai tão rápido, que a vovó não tem mais perna pra corrida não. Volta aqui, Joãozinho! Pra onde você vai? Joãozinho?
João?
Hoje mesmo um homem bateu em mim. Achou que ia lhe roubar, quando eu queria era lhe pedir somente um trocadinho pro café.
Caneta rosa, caneta amarela, caneta verde, caneta preta, caneta branca, caneta azul?
– Não, obrigada.

E você deve achar que estou muito acabado. Mas juro que não é vício não. É a pura necessidade, misturada com fome. Não gosto de pedir dinheiro não, mas...
Senhores passageiros. Atenção, por favor!
Procura-se João Gabriel Batista, de cinco anos de idade. Cabelo castanho, camiseta azul.
Rosa?
Guilherme? Quanto tempo!
40 anos...
Como o tempo voa...
Indo pro Cariri?
E você lembra disso?
Nunca lhe falei, mas há 40 anos que lembro cada dia de você.
... pelo amor de Deus, compre algum salgadinho para mim. Que já é hora de dormir e hoje ainda não comi.
...
Deus acompanhe você.

EM - MULHERIO DAS LETRAS PORTUGAL (PROSA E CONTOS) - COLECTÂNEA - IN-FINITA

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