terça-feira, 23 de junho de 2020

Memórias. Fragmentos. De uma história. - ADRIANA MAYRINCK

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Menina de pés descalços correndo para agarrar o vento. Jeito de moleque, joelhos ralados e sorriso nos lábios. Perde-se nos livros e nas brincadeiras. Agarra o irmão e entre brigas e provocações, crescem. A irmã, quer fazê-la de boneca, cuida, protege. E deixa-a de lado quando lhe apetece. Criança feliz. Acarinhada, amada, mimada.

Moça rebelde que busca ir além da sua imaginação. Inconstante e inconformada com as paredes in-visíveis que lhe tolhem a necessidade de voar. Percorre abismos, montanhas e estradas. Joga-se, arranha-se – vive! Pele bronzeada e cabelos ondulados - de flores e maresia. Vestido esvoaçante da cor dos seus sonhos. Joelhos esfolados. E alma liberta. Alegria e Melancolia na mesma proporção. Rasga-se, renasce!

Filha, irmã, neta, sobrinha, tia... sempre presente – do lado de dentro - mesmo nas ausências. Deixa-se fincar em suas raízes e por mais passos que dê, carrega todos na sua história, memória e coração. Gratidão pela família que chama de sua. As de sangue... as de laços.

Amiga afetiva, respeita a individualidade de cada um que se aproxima. Permanece. Mas também deixa ir. Sofre, conforma-se. Sempre rodeada de afetos, abraços, lembranças, chegadas, partidas. Altruísta. Adora estar perto deles. Sempre. Confidências, tristezas, alegrias, aventuras, viagens, gargalhadas, debates, momentos, instantes, eternidades.

Mulher determinada e segura da sua essência. Abre caminhos com sangue, suor e lágrimas. Acredita em si, e ultrapassa todos os seus limites para realizar projetos, desejos e quimeras. Precisa do vento, do mato, do sol, do mar. Para respirar. E da lua cheia. Joelhos marcados. Intensa, impulsiva, rebelde, desprendida, distraída e teimosa. Finge indiferença – para sobreviver. Apaixonada. Derrete-se, emociona-se nas histórias de vidas. Quer mudar o mundo, revolta-se - silencia.

Mãe, solteira, intensa e incondicional. Partilha a vida, a cada segundo com o seu coração que bate fora do peito. Unidas, companheiras, cúmplices. Desfaz-se em mil pedaços para aconchegar, proteger e aquecer a sua cria. Amor infinito e incomensurável. Tem imenso orgulho do Ser Humano que trouxe ao mundo, à vida, à humanidade. Está, é, e sempre será o porto seguro, o ponto de referência e o abrigo.

Profissional rígida e responsável. Perfeccionista, parceira e agregadora. Inconformada, justa, acrescenta melhorias, regras, idealiza, luta, ultrapassa. Acredita na partilha de ideias, de ideais, de experiências. Busca sempre, e o não é o seu último recurso. Vai além das possibilidades e criações. Resiliente. Gosta de gente.

Autora indisciplinada e insatisfeita, quer saber mais, superar-se. Nas entrelinhas e nas metáforas encontra seus reflexos. Prefere deixar-se guiar por seus pensamentos e não manter uma rigidez no processo criativo. Ama a palavra em todas as suas formas de expressão. Precisa estar rodeada de livros, música, vinho e chocolate.

Esposa aprendiz, romântica incondicional, frustra-se com a falta de poesia na rotina, no avesso do outro. Avança sem medidas para a simbiose, unicidade. Embates. Sempre de mãos dadas, atadas. Mergulha no Outro, com os seus sentimentos mais profundos. Isola-se, individualiza-se e volta a superfície, sempre mais terna e convicta de que é Amor - para todos os dias - com os seus significados, elementos, sentidos, sentires, sabores e dissabores.

E meio século se passou... Nos seus dias, nas suas fases, nos seus tempos. No tempo de festejar esse cinquentenário, de celebrar e realizar... Uma pandemia mudou tudo. Adiou projetos, desejos, sonhos, convívio, viagens, encontros. Empurrou para um mergulho em si mesma, e para uma outra percepção de pertencimento. Da vida. Do agora.

Tempo de refúgio, ficar em casa, de serenidade, harmonia, filosofias, amadurecimento, questionamentos e percepções.

Tempo para re-pensar, refletir, olhar para trás e para dentro. Estar. Desconectar. Aquietar-se, encolher-se. Isolar-se. Re-inventar-se.

Tempo de olhar para o lado de fora, para os outros, para o além dos muros, das fronteiras, do mundo, das barreiras, do amanhã.

Tempo de solidariedade, sensibilidades, desprendimento, imaterialidade, efemeridades. E renovação.

Tempo de espelhos, de janelas, de ecrãs, de telas.

Reais, virtuais, irreais, surreais.

EM - MULHERIO DAS LETRAS PORTUGAL (PROSA E CONTOS) - COLECTÂNEA - IN-FINITA

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