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Dia agitado na organização que presta serviços de aconselhamento jurídico a refugiados e imigrantes.
Nos últimos minutos de expediente adentra um rapaz de semblante grave, mas bastante educado e com bom entendimento da língua do país onde estava agora residindo.
– Bom dia, senhora. Gostaria de saber o que é necessário para trazer minha esposa, que ficou no Afeganistão.
A jurista explica todo o procedimento e os requisitos obrigatórios a serem cumpridos a fim de possibilitarem a vinda da esposa. Legalmente, tudo correto e a documentação trazida para conferência estava, da mesma forma, dentro do exigido. O marido - originalmente refugiado sírio – já residia há anos no país europeu que lhe conferiu asilo; já exercia trabalho remunerado e ganhava o suficiente para demonstrar às autoridades que tinha reais condições de trazer sua esposa para morar consigo.
Com a resposta da profissional, o consultante demonstrou alívio, mas um único detalhe foi suficiente para que retomasse o semblante grave: era também requisito obrigatório que a esposa fosse, pessoalmente, à embaixada do país que receberia o pedido de reunião familiar para entrega da documentação.
– Meu Deus, minha esposa terá de ir pessoalmente e fazer tudo sozinha?
– Sim, senhor. Do contrário, o processo não será aceito se for feito através de advogado ou terceira pessoa. Precisa ser sua esposa em pessoa.
– Sabe, senhora, por isso meu desejo em tirá-la de lá o mais rápido possível: ela, obviamente, fará tudo o que eu disser ou meu pai ou meu irmão, mas não terá muito domínio do que estará fazendo. Ela irá pessoalmente, mas, com toda a certeza, terá de ser acompanhada por um homem, porque lá as coisas funcionam assim ainda, infelizmente. Quero deixar tudo o mais “mastigado” possível no intuito de evitar complicações que ela não terá condição de resolver, por mais simples que sejam. Por isso, também, todo meu esforço em trazê-la: para que veja que as mulheres têm direitos, liberdade e podem resolver coisas quotidianas por si mesmas!
Após preencher os últimos documentos e o breve desabafo, o marido despediu-se, agradecendo a consultoria prestada.
A jurista, acostumada à repetição mecânica, diária e profissional do “sua esposa precisa ir pessoalmente”, deu-se conta de que, até então, jamais havia pensado sob esse prisma. Suspirou, silenciou e tergiversou: “a mulher, de todos os dias, que somos aqui, não é a mesma mulher, de
todos os dias, de lá. Triste!”
Envolta em pensamentos, fechou a porta atrás de si e rumou para casa!
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