quinta-feira, 25 de abril de 2024

A fantástica fábrica de rapaduras (excerto 1) - Maria Aliender

LIVRO GENTILMENTE CEDIDO POR IN-FINITA
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Semana de pular da cama de madrugada para lamber prosa em volta da fornalha feita de tijolos que sustentava o tacho de caldo de cana caiana, que antes era moída no engenho artesanal de ma- deira movimentado por uma junta de bois que apesar de sentir pena dos pobres animais se esforçarem tanto, eu achava bonito aquela disciplina deles e se não fosse o sacrifício eu teria saudade até dessa parte. Mais tarde essa tarefa dos bois foi substituída com louvor, diga-se de passagem, por um motor a gasolina e posteriormente por um elétrico. Pegávamos o caldo da cana, fonte de vitaminas B e C e muitos outros nutrientes como: ferro, cálcio, potássio...

EM - ENTRE ROSAS, TUIUIÚS E BONECAS DE MILHO - ELI COELHO, MARCOS COELHO, MARIA ALIENDER - IN-FINITA

quarta-feira, 24 de abril de 2024

Diário do absurdo e aleatório 288 - Emanuel Lomelino

Imagem eas

Diário do absurdo e aleatório 

288

A passo lento, Rómulo pisa a calçada, ainda húmida do orvalho matinal, como quem tem uma pedra no sapato e as meias encharcadas.

No rosto, carcomido pela insónia, leva estampada uma história de tormentas cosidas a desencontros e linhas tortas. No canto do olho, como em todos os dias amargos, carrega o reflexo de lágrimas por libertar, que nem a cacimba é capaz de disfarçar.

O manto puído dá-lhe o poder da invisibilidade perante a turba que se acumula junto ao semáforo, sem tempo para olhar o mundo tal qual ele se apresenta.

Ao ronco das entranhas, Rómulo responde colocando a sua mão boa – a que tem menos escaras vivas – no que resta do bolso direito. Saca a côdea do desafogo das últimas semanas e, com a prática de um golpe de indicadores, solta duas migalhas que leva à boca salivante.

Olha em redor, como quem anseia ver algum conhecido, e regressa, inexpressivo, ao interior da caixa de frigorífico, onde se abriga nas noites selvagens de Inverno, para mais uma tentativa de hibernação – o sono pode não ser pacífico, no entanto, tem o condão de apaziguar o estômago por mais algumas horas, até à próxima dose de migalhas.

EMANUEL LOMELINO

Lavagem cerebral (excerto 2) - Luís Vasconcelos

LIVRO GENTILMENTE CEDIDO POR IN-FINITA
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Os líderes religiosos são como os políticos. Fazem sempre questão de usar um tipo de linguagem tão bizarra e rebuscada, que se calhar eles próprios já nem pensam no que estão a dizer, quanto mais os crentes, no que lhes é dito. Frases feitas, discursos decorados. Rezas e ladainhas todas as religiões, sem exceção têm. Cada qual à sua maneira, mas têm. Expressões e frases repetitivas. ou então pregações especialmente preparadas para mexer emocionalmente com pessoas mais frágeis, carentes e crédulas, muitas vezes atravessando períodos de dor e sofrimento muito intenso.

EM - COMEÇAR DE NOVO - LUÍS VASCONCELOS - IN-FINITA

terça-feira, 23 de abril de 2024

Diário do absurdo e aleatório 287 - Emanuel Lomelino

Diário do absurdo e aleatório 

287

Os olhos, hipnotizados pela maré vazante, ficam presos no coração do Tejo que pulsa, indiferente às traineiras e aos voos das gaivotas, com espelhos a surfar na serena agitação, das suas águas turvas, provocada pelo rastro de um catamaran. Há uma brisa que beija os rostos transeuntes como que anestesiando-os do abraço solar, fora de época, e oferecendo a maresia como perfume de consolo e paz.

Ouve-se, ao longe, a banda-sonora indistinta saída da garganta rouca de um violão, acompanhada pela voz melodiosa, mas murmurada, de uma cantora gospel, que faz da rua o seu anfiteatro, junto a um malabarista de sapateado clássico.

Só falta um pintor, de tripé em riste e as mãos ocupadas com pincéis e uma paleta mais colorida do que o arco-íris, para que se forme o cenário perfeito: a natureza, ela própria uma obra de arte, rodeada de artesãos vários.

EMANUEL LOMELINO

A qualquer hora da noite (excerto 11) - Geórgia Alves

LIVRO GENTILMENTE CEDIDO POR IN-FINITA
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Houve um breve suspiro, Cora se recupera da sensação de tontura, Jaú da enorme frustração e contenção de amor quase feito, deita-se enquanto ela desfaz as roupas da mala, colocando-a ao lado do corpo dele, seu grande mistério é saber como foi capaz de abrir os olhos, estava tão enlevada pela sensação de ternura, de desejo de fazer amor. 
Jaú quase não escuta mais, sua voz fica baixa, como um grão de areia quisesse emitir sons sobre o arrastar tanques da primeira grande guerra. Voz em luta contra o pesado silêncio que toma conta do quarto.

EM - A QUALQUER HORA DA NOITE - GEÓRGIA ALVES - IN-FINITA

segunda-feira, 22 de abril de 2024

Diário do absurdo e aleatório 286 - Emanuel Lomelino

Diário do absurdo e aleatório 

286

Como não bastasse a densidade do bosque, com as suas altivas árvores de copas escuras e tão espessas que o sol não as trespassa, ainda se pôs este nevoeiro cerrado que cega o início do olhar.

Apenas ruído. Uma espécie de assombro canalha que gela pedras e raciocínio. Um tilintar indistinto, contudo macabro, fúnebre e tão encantatório como um coro de sereias à caça de náufragos.

O caminho, à margem das vespas e espinheiros, faz-se irregular, qual montanha-russa num parque de diversões devoluto.

Ouve-se o piar de uma coruja-das-torres e um indefinido restolhar, ténue e miúdo, tão rasteiro como uma subcave invisível, mas presente.

Subitamente, num passo de mágica, abre-se uma clareira tão larga quanto negra, como fosse o leito de uma gigantesca fogueira antiga, que oferece três trilhos. Um de seixos brancos e lisos de erosão, outro coberto por um tapete de folhagem calcada, o terceiro enlameado, íngreme e invadido por troncos tombados.

Os dois primeiros reentram no bosque. O último, menos convidativo, circunda a clareira e embica na direcção oposta. Por via das dúvidas, incorpora-se o espírito de Régio e segue-se adiante.

EMANUEL LOMELINO

O dia em que a música acabou (excerto) - Renata Campos

LIVRO GENTILMENTE CEDIDO POR IN-FINITA
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Quando nos casamos, cumprimos protocolos pré-estabelecidos pela sociedade. A validação de que o caminho está correto vem através dos filhos, uma combinação perfeita e imposta para uma vida bem-sucedida.
Essa história poderia ser minha, mas é da Cristiane Corga e espero que inspire outras mulheres presas em cativeiros, com a alma dolorida, numa rotina sem saída.
Mãe de três filhos e inserida num segundo casamento abusivo, precisou encontrar a hora certa de morrer para renascer. Aos cinquenta anos cansada daquela arena, acreditou que a vida podia ser melhor. Se preencheu de coragem e saiu.
Durante seis anos, ficou casada com o primeiro marido, com quem teve dois filhos. A relação era movida pela felicidade e prazeres. Mas aos poucos, foi invadida pela sensação de não reconhecer quem estava ali. A brincadeira de casinha estava dando lugar ao começo da vida real. Já não cabiam mais os “felizes para sempre”, e o amor se transformou em dor.

EM - SEGUNDA PRIMAVERA - RENATA CAMPOS - IN-FINITA

domingo, 21 de abril de 2024

Diário do absurdo e aleatório 285 - Emanuel Lomelino

Diário do absurdo e aleatório 

285

De nada serve abrandar ou ziguezaguear a vida por medo da morte. Fazê-lo é prescindir das cores que a primeira contém, substituindo-as pela beleza daltónica da segunda, sempre em tons esbatidos e duvidosos.

Não adianta colocar pé no travão da existência porque as pétalas do tempo não se comovem com o abrandamento do passo e seguem, flutuantes, rumo à finitude da sua queda.

Não há fontes de água-benta que impeçam o pólen de Hades de espalhar-se entre a humanidade e aumentar a sua colecção de almas.

Mais confortável é aceitar com naturalidade o fim assegurado, deixando-o navegar nos mares da ignorância, como quem espera o sorteio da loteria sabendo que as hipóteses de ganhar são superiores a qualquer outra sorte.

EMANUEL LOMELINO

Teia no jardim - JackMichel

LIVRO GENTILMENTE CEDIDO POR IN-FINITA
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Certo dia, Nôrzinha foi brincar no vasto... claro... florido... jardim da fazenda, como sempre fazia após seu café da manhã. 
Correndo, serelepe, ela deu voltas... giros... giros... e... mais voltas... em torno das roseiras, craveiros, papouleiras, demorando-se um pouco mais nos jasmineiros que estavam em flor e exalavam um suave perfume único. 
Porém, em dado momento, a menininha cansou-se de tanto correr... e, parando um pouco para descansar, qual não foi a sua surpresa ao ver brilhando ao longe, sob um foco de sol, uma delicadíssima teia de aranha que, de tão leve, era soprada pelo vento.

EM - NA CORTE DE MADAME ARANHA - JACKMICHEL - IN-FINITA

sábado, 20 de abril de 2024

Diário do absurdo e aleatório 284 - Emanuel Lomelino

Diário do absurdo e aleatório 

284

Nestes dias em que acordo com o reverberar da chuva pregado nos ouvidos e inspiro ursos polares, pela única narina desentupida, evito levar os dedos antárticos ao rosto coberto pela inclemência das horas.

Enrosco-me na fogueira de linho e maldigo a vertigem da noite, num gesto de revolta inconsequente que, por si só, aumenta o sufoco de mais um dia de pedras laminadas.

Contragosto, maquilho-me de feliz artífice, de uma arte que abomino, para mascarar o incómodo que o ambiente circundante provoca de véspera.

Nas ruas da cidade já deambulam outras carcaças abatidas pelos ventos gélidos da Fortuna, com as cabeças recolhidas num conformismo nefasto.

Tento alhear-me da lentidão dos ponteiros observando os voos caducos das gaivotas e interrogando-me sobre os guinchos negros dos corvos que fazem malabarismos acrobáticos nos cabos de alta-tensão.

E tudo isto, como uma sessão contínua de mau cinema, repete-se ciclicamente no turno do sol, cujo brilho há muito deixou de animar os meus passos.

EMANUEL LOMELINO

O poder das ancas (excerto 1) - Monica Rocha

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Observo que esse movimento segue semelhante ao ponteiro do relógio e a púbis desenha um círculo na direção do teto. O sacro escorrega em várias direções, desenhando no chão o mesmo formato desse círculo. Nasce a primeira sensação, prazer! Ai, que delícia! As articulações dentro da virilha que estavam travadas começam a lubrificar fazendo escorrer entre as pernas uma sensação de leveza nesse movimento gostoso que acontece lentamente. E nele não deve haver qualquer esforço; pelo contrário, é suave, despertando o lugar do sensível e do sútil.

EM - CONVERSAS MADURAS - COLETÂNEA - IN-FINITA

Lagoa dourada (excerto 2) - Maria Aliender

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Então, desesperada ela se pôs a gritar tão alto que não de- morou ser ouvida em todo povoado e logo vieram funcionários e vizinhos, afinal a mãe ao gritar rasgava a alma despindo-se naquele momento de toda subordinação ao marido. Procuraram por toda a noite em vão, pois nunca encontraram o corpo da filha amada. Segundo relatos de uns pescadores que por ali passavam, avistaram um bando de cisnes negros levando um corpo miúdo, enquanto voavam em forma de coração no céu, por certo pressentiam a passagem e o sofrimento da moça e quiseram esconder de todos, seu rosto triste, levando-a para jogar em uma onda qualquer. Daquele dia em diante o moço nunca mais foi visto na região, correu o boato de que ele fugiu para a mata e morreu de desgosto.

EM - ENTRE ROSAS, TUIUIÚS E BONECAS DE MILHO - ELI COELHO, MARCOS COELHO, MARIA ALIENDER - IN-FINITA

sexta-feira, 19 de abril de 2024

Diário do absurdo e aleatório 283 - Emanuel Lomelino

Diário do absurdo e aleatório 

283

Começam-me a faltar fórmulas para explicar o gosto pela leitura e o prazer de ler livros em catadupa.

Chamem-lhe obsessão, vício, dependência, mania, sede de conhecimento, paixão, até loucura. Aceito todos os epítetos com a mesma naturalidade com que passo de Celan para Agustina, de Tchekov para Sophia, de Quintana para Hatherly, de Camilo para Pasternak, de Orwell para Vergílio, de Márai para Torga, de Eugénio para Gógol, de Pessoa para Steinbeck, enfim, de livro para livro, sem olhar a filosofias, épocas, proveniências ou géneros literários.

Sou um bicho das letras auto enclausurado nas badanas de um mundo paralelo, por onde deambulo em busca de respostas às perguntas que nunca fiz porque, só assim, consigo justificar a esquizofrenia que me abraça e faz-me sentir, bem vincado no âmago, este desenquadramento temporal.

Ler transformou-se numa epopeia lúcida com o objectivo de afastar a angústia de estar onde não pertenço, nem quero estar, e descobrir o espaço e tempo onde poderia encaixar-me como uma peça de puzzle.

EMANUEL LOMELINO

Lavagem cerebral (excerto 1) - Luís Vasconcelos

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Puseram-me, porque eu assim o permiti, um pesado fardo de normas, regulamentos, exigências permanentes e constantes que me faziam sentir forçado a ter de ser diferente das “pessoas do mundo (eram assim apelidados depreciativamente os cidadãos que não pertenciam à Igreja)!! Mas afinal em que mundo vivia eu? Em Marte? Na Lua? Sim, confesso, era por lá que a minha cabeça, às vezes, andava! Talvez para me tentar esquecer do que a minha consciência indevidamente manipulada e manipulável me fazia lembrar!!

EM - COMEÇAR DE NOVO - LUÍS VASCONCELOS - IN-FINITA

quinta-feira, 18 de abril de 2024

Diário do absurdo e aleatório 282 - Emanuel Lomelino

Diário do absurdo e aleatório 

282

Sabes, Celan, desconheço se a tua ligação emocional com a morte era mais do que revolta por Auschwitz e, por isso, não sei se este nosso não-tabu pode, de alguma forma, ser comparável.

Apesar da liberdade que me dou ao falar amiúde sobre ela, porque morro constantemente, e ao contrário de ti, não é um fascínio mórbido que me move, mas sim a consciência lúcida de uma inevitabilidade.

Posso dizer-te que, da minha parte, a morte nunca vislumbrará medo nos meus olhos ou coração. Não me intimida pelo breu, pela incerteza do que vem depois, nem pela imagética associada.

Mesmo desconhecendo a forma como a definitiva vai reclamar-me à vida, sei que ela espera por mim e está cada vez mais próxima. E quanto mais o relógio avança menos tempo sobra para falar dela.

Espero apenas que os meus discursos, quase tão negros como os teus, não me levem a um final igual. Neste momento prefiro ser abraçado por ela do que abraçá-la.

EMANUEL LOMELINO

A qualquer hora da noite (excerto 10) - Geórgia Alves

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Cora congela diante da imagem. O corpo dela não é mais de cinco segundos antes. Nem o dele. Jaú se afasta. Pensa, “viemos passar segunda lua-de-mel, neste paraíso, e quem é você Cora, para dizer esta palavra em meu ouvido?” Não diz nada, mas encara a mulher por um segundo. Reflete o que vai dizer, aquele instante pode se repetir pela eternidade. Uma eternidade que não deseja. 

EM - A QUALQUER HORA DA NOITE - GEÓRGIA ALVES - IN-FINITA

quarta-feira, 17 de abril de 2024

Diário do absurdo e aleatório 281 - Emanuel Lomelino

Imagem retirada da internet

Diário do absurdo e aleatório 

281

Por mais inclusivo e tolerante que se seja aos diferentes pensamentos das múltiplas doutrinas literárias contemporâneas, existem confissões que, ao pregar a boa-nova, espargem paradoxos que só criam raízes nos menos avisados.

Estas facções evangelizadoras da literacia moderna, ao mesmo tempo que se apresentam estratificadas, criam uma auréola classista pela transmissão das suas mensagens.

As liturgias são ocas de coerência estilística, não por definição profética propositada, mas por défice cognitivo inerente. Não existe raciocínio lógico fundamentado na solidez de ideias inovadoras, tampouco incentivo ao arrojo.

As eucaristias são cerimónias de pretensão e ufania mascaradas de certame abrangente, não por crença filosófica, antes pelo engodo pastoral dirigido aos devotos.

Os grã-mestres usam o eruditismo e eloquência das palavras frívolas para magnetizar a crendice dos fiéis simples, num catecismo de verdades e presságios que só a eles se aplica.

Por tudo isto louvo, cada vez mais, o meu entendimento agnóstico, que me impede de ingressar nessas seitas.

EMANUEL LOMELINO

Meditar e respirar (excerto) - Renata Campos

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Vivemos em um mundo onde a atenção plena foi desviada, e com ela, a chegada de tantas enfermidades. A pressão do dia a dia está encurtando a nossa capacidade de observar e respirar. Compreender nossas reações diante dos acontecimentos provocados pela velocidade em que estamos inseridos é de extrema importância e urgência.
Como restabelecer a conexão com o momento presente diante dessa epidemia de multitarefas? Acredito que a meditação é uma das formas de treinar nossas conexões neurais. É uma ferramenta que nos auxilia a cultivar nossa capacidade de autocuidado e autoconhecimento. É quando nos enxergamos sem julgamentos. Um lugar para estarmos consciente diante da vida.

EM - SEGUNDA PRIMAVERA - RENATA CAMPOS - IN-FINITA

terça-feira, 16 de abril de 2024

Diário do absurdo e aleatório 280 - Emanuel Lomelino

Diário do absurdo e aleatório 

280

- … Claro que conheci o professor Licínio! O sujeito mais louco e estimado da aldeia. Foi com ele que aprendi a ler, como muitas gerações desde o tempo em que os meus pais eram crianças.

Transformou a sua garagem num gigantesco salão de leitura, com as paredes forradas a livros, que as editoras lhe enviavam continuamente, e a porta sempre aberta para quem quisesse entrar.

Ele passava o dia a ensinar as letras, a formar palavras, a construir frases, aos mais novos, enquanto incentivava os maiores a pensar no que liam e a escreverem as suas próprias histórias.

Não era estranho vermos, além de crianças pequenas e adolescentes, o salão pejado de adultos, que aproveitavam para ler os livros que ali havia e tentavam cometer a proeza de fazer o professor Licínio sair para a rua, coisa que ele nunca fez em vida, nem mesmo para comprar bens essenciais, que encomendava, no início por telefone, depois por internet, porque havia outra porta, ao fundo da sala, que comunicava com a sua casa e ele tinha jurado que só sairia dali no dia em que não lesse um livro.

Só o conseguiram retirar daquela casa aquando do seu funeral.

EMANUEL LOMELINO

Nôrzinha - JackMichel

LIVRO GENTILMENTE CEDIDO POR IN-FINITA
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Linda... pequenina... assim era Nôrzinha, a inocente Leonor Brasil, de 4 anos de idade. 
Com faces cor de maçã, emolduradas por longos cabelos castanho-escuros, presos num branco laçarote de fita que tremulava quando ela corria... 
Sempre vestia um vestidinho de alvo cetim, que lhe fazia parecer um querubim!...

EM - NA CORTE DE MADAME ARANHA - JACKMICHEL - IN-FINITA