quarta-feira, 20 de junho de 2018

DEZ PERGUNTAS A... SÉRGIA A.


Agradecemos à autora SÉRGIA A. a disponibilidade em responder ao nosso questionário

1 - Como se define enquanto autora e pessoa?

Tenho dificuldade em me definir como pessoa e como autora também. Talvez porque não me considere pronta, e isso se repercute na escrita. Mas, arrisco em uma palavra: Aprendiz. Aprendiz de ser humano. Aprendiz de poeta, de cronista, de contista com desejo de ser romancista. Acho que é isso. Sou aprendiz do tempo.

2 - O que a inspira?

O espetáculo grandioso da vida. A natureza. A não linearidade, suas curvas cheias de riscos e de descobertas. O ser humano e sua capacidade de viver tempo bom e tempo ruim. 

3 - Existem tabus na sua escrita? Porquê?

Sim (inconscientes até) porque somos educados para o limite do que é considerado aceitável, principalmente na linguagem. Por mais que tentemos romper tais limites, a educação das mulheres dentro do patriarcado formata desde cedo o pensar. Sou perseguida por muitos não ditos. Nisso também sou aprendiz, afinal tento representar universos e crio personagens em tais universos, entre eles, de repente, podem surgir os que quebram tabus.  

4 - Que importância dá às antologias e colectâneas?

Considero as antologias e colectâneas muito válidas. São essenciais para os novos autores, em especial os que não estão nos grandes centros, que precisam de espaço para publicar o seu trabalho com o aval de um organizador com experiência literária. Do ponto de vista de leitor, são também importantes quando reúnem autores consagrados por trazerem em um só livro vários estilos, o que facilita a busca, posterior, pelos nomes que prenderam a atenção.

5 - Que impacto têm as redes sociais no seu percurso?

A internet, como um todo, favoreceu muito a minha decisão de levar adiante a escrita (falo do acesso a obras de arte, literárias ou não, a autores de outras línguas, a pessoas distantes, à pesquisa, etc). Minhas primeiras publicações foram feitas no blog Palavras de.Lirantes, que edito desde 2011, e em seguida em revistas eletrônicas. Quanto às redes sociais, vejo-as também como impulsionadoras. É de lá que recebo críticas espontâneas e com uma resposta muito rápida. É lá também, principalmente nos grupos/coletivos, que vejo em tempo real o que está acontecendo no mundo literário. A partir daí posso selecionar e procurar o aprofundamento com o que, de fato, interessa. Embora a escrita, ao longo da minha vida, tenha sido apenas um jeito de tentar entender o mundo e aplacar as minhas angústias, e durante muito tempo eu não desejasse a exposição, fui convencida por esse ambiente de que vale a pena levar ao outro o que escrevo, utilizando também outros meios como o livro físico.

6 - Quais os pontos positivos e negativos do universo da escrita?

Positivos: 
a) para o indivíduo, o ato de escrever além de prazeroso o liberta do mundo particular, o tornando capaz de observar ao seu redor e se colocar no lugar do outro. E mesmo quando traz apenas a escrita de si, não deixa de ser libertador e capaz de tocar, uma vez que os humanos somos muito diferentes e muito iguais ao mesmo tempo. 
b) considerando o geral, o contato mais regular com outras pessoas que se dedicam a ler e escrever é gratificante, nos traz uma sensação de pertencimento, de que não estamos sós.
      Negativos: 
a) no âmbito individual: a angústia que nos persegue, pela necessidade de escrever. Diz um poeta da minha terra, Paulo Machado, que "fazer poemas é fácil/ como amordaçar um lobo". Ao amordaçar lobos corremos o risco de nos ferir, arranhar a pele, sangrar.  
b) no geral: em um país que lê tão pouco, está sempre presente a falta de reconhecimento, de oportunidades e remuneração a quem produz literatura, como também a concentração de poder nas grandes editoras que tem regras próprias para julgar e selecionar, etc. São poucos os que conseguem viver da escrita, o que é desestimulante e cansativo. 

7 - O que acredita ser essencial na divulgação de um autor?

Nunca pensei sobre isso. Mas, acredito que a primeira questão é a leitura atenta, o resgate do cuidado, da qualidade da escrita, daquilo que chamou a atenção naquele(a) autor(a). Ou seja, que a divulgação se faça a partir da análise da obra e não apenas com intuito comercial ou de outros interesses. 

8 - Quais os projectos para o futuro?

Acabo de publicar meu primeiro livro, Quatro Contos - Quimera Editora (2018), estando ainda envolvida com o processo de divulgação. Estou finalizando um livro de poemas (reunindo os já publicados no blog e outros que ainda estão em construção), mas ainda sem definição de data, editora, etc. Participo de um projeto de "reconhecimento" com duas fotógrafas e uma cineasta (ainda em busca de patrocínio) sobre o universo de mulheres simples do interior do Piauí, cujas vivências de trabalho e criação impactam positivamente o seu entorno. Pretendemos, ao final, produzir um livro de fotografia e poemas, e um documentário. O último, mas não menos importante: escrever um romance cujas personagens e histórias estão soltas na minha cabeça há muito tempo.

9 - Sugira um autor e um livro!

O último que li:  O Ministério da Felicidade Absoluta, da escritora indiana Arundhati Roy, com tradução de José Rubens Siqueira.

10 - Qual a pergunta que gostaria que lhe fizessem? E como responderia?

Uma clássica que não sei responder e teria oportunidade de explicar: Qual o(a) autor(a) preferido?  
Não consigo dizer "é esse" porque eles vão e voltam. Causaram-me grande impressão, na adolescência, as personagens das irmãs Brontë, de Louisa May Alcott (em Mulherzinhas) e de Gabriel Garcia Márquez. Depois vieram Dostoiévski, Tolstói. Não entendia, mas os livros estavam à minha disposição e eu lia. Algo me pegava pelo sentimento mais do que pela compreensão das palavras ou da frase bem construída. Depois vieram os poetas, da bibliografia obrigatória da escola aos outros que eu, já adulta, procurava: Castro Alves, Manuel Bandeira, Carlos Drummond, Cecília Meireles, Fernando Pessoa, H. Dobal, Mário Faustino, Manoel de Barros, Adélia Prado. Na tardia faculdade de Letras, descubro os de língua inglesa: Shakespeare, Dickens, e. e. cummings, Virginia Woolf, Hemingway, Jane Austen, Sylvia Plath. Volto, de repente, para outros de língua mais próxima como Florbela Espanca, Saramago, Walter Hugo Mãe, Mia Couto, Isabel Allende, Idea Vilariño, Leonardo Padura. Mergulho no espanto que a descoberta de Conceição Evaristo, Herberto Helder e Wislawa Szymborska me causaram mais recentemente. Assim sigo, sem saber o que será de mim amanhã.

Acompanhem, curtam e divulguem esta e outros autores através deste link

2 comentários:

  1. Misto de orgulho, alegria e satisfação saber dessa esplendorosa peripécia, na qual você traduz, de forma tão sincera, bela e envolvente suas impressões e sentimentos, acerca da aventura de ler, escrever e pensar! Você é excelente, podes crer e apostar!

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  2. Obrigada pelo comentário e pelas palavras generosas, Uchoa! Vamos seguindo o caminho. Um abraço.

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