Lomelinices
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Quando os passos se tornam um fardo pesado, a mente, incoerente como só ela, afasta-se ainda mais do corpóreo e abraça o caos das ideias, como quem só consegue cumprir-se na desordem.
Então, num caleidoscópio de propósitos e desígnios emaranhados, surge o alheamento às mazelas do corpo e respirar volta a ser um gesto sem aflição.
Todos os hematomas, cicatrizes e feridas abertas transformam-se em galardões impessoais, como se, num golpe de mágica, os ardores e agonias dolorosas ganhassem a virtude da insensibilidade.
Os horizontes deixam de ser distância angustiante e invertem-se as prioridades – os sonhos dissipam-se e a verdade está nos detalhes do impalpável.
O tempo perde o brilho. A realidade é difusa. As pálpebras são cortinas. As vozes esfumam-se. O bocejo solta-se. E por fim adormeço anestesiado por esta esquizofrenia jazzística.
EMANUEL LOMELINO
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