Paulo
de Carvalho, escritor e poeta, com dois livros
publicados, Kyrie e Cantabile. Nascido no ano de 1955, na cidade de Niterói, RJ, iniciou desde cedo suas
incursões no cenário artístico-cultural. Atualmente dedica-se ao seu trabalho
como Designer Gráfico/Diagramador e editor. Fundador da Editora Armazém de
Quinquilharias e Utopias, e militante incansável da literatura. Produtor e
organizador do movimento literário e do Franzine Alfarrábios, é com imensa
alegria e orgulho que agregamos ao time da Assessoria Literária In-Finita, esse
dinamizador da arte da escrita.
Kyrie:
O tecnicismo dos nossos tempos cria a exigência
de ações precisas e urgentes na busca incessante de objetos, produtos e
serviços cada vez mais eficazes, avançados e sofisticados, cujo sentido se
dissolve no atendimento ao consumismo e à satisfação narcísica dos indivíduos.
Deste modo, se, por um lado, experimentamos os avanços científicos e
tecnológicos em pról de uma melhor qualidade de vida; por outro lado,
vivenciamos a destruição da natureza e a anulação da subjetividade como efeitos
de tais avanços. Este livro de Paulo de Carvalho, escrito em linguagem
rebuscada e repleto de simbolismo, não representa, tão somente, o fruto de suas
introspecções. Ele é, acima de tudo, resultado de vivências, observações do
âmbito eclesiástico, estudos, pesquisas e análises das Sagradas Escrituras,
revelado em forma de poemas exortativos. Seu conteúdo ressalta aspectos
sociopolíticos e religiosos da vida contemporânea remetendo o leitor a diversas
indagações filosóficas e teológicas. A articulação entre as Sagradas Escrituras
e a Poesia faz de sua obra uma inovação, tendo o autor o seguinte princípio-
Deus é Poesia e todos os Homens são poetas?. Contudo, antes de fomentar uma
reflexão acerca da relação que o homem es elece com Deus, os poemas de Paulo de
Carvalho incitam a pensar sobre a relação que os homens es elecem entre si,
consigo mesmo e com a Natureza, principalmente, em nome Dele. Pois, no que
tange às relações humanas e do que delas decorrem, não experimentamos avanço ou
progresso semelhante aos já citados. Onde hoje natureza viva por mesas mortas
Fartas ceias fartam sujeitos fartos. Fartos de brindes e brilhos - (Cansada
Ceia). Se a Poesia é uma criação literária, manifestação artística, forma de
linguagem rica em metáforas e analogias, embalada em pura transcendência, por
que não ser usada como ferramenta que possibilite uma outra visão de mundo?
Andreia Santos de Carvalho, Psicóloga - Mestre em Pesquisa e
Clínica em Psicanálise (UERJ).
Podem ler o texto integral neste link
Cantabile:
A ReDescoberta da
Poesia: Paulo de Carvalho e seu Cantabile
Fabio Ulanin*
Os gregos tinham duas palavras para se referir à
criação: techné e poiésis. A primeira relacionava-se às artes práticas — o
fazer técnico, utilitário, voltado para os afazeres domésticos ou comerciais; o
segundo — a Poiésis — ia mais além: revelava a criação maior, aquela que, no
Íon de Platão, era reservada ao aedo, o poeta que, iluminado (ou tomado) pelos
deuses, revelava o saber maior, mais antigo, intenso, da existência humana. Não
por acaso que, na Odisséia, Homero deixa, logo em seus primeiros versos, a
palavra narrativa para a Musa. Ao invés de pedir para o Alto o direito de
narrar “a Ira de Aquiles” (como na Ilíada), entrega à própria palavra-poética
as aventuras do regresso do herói Odysseus. Entre o curvar-se à Musa (aquela
Calíope que detém o herói em suas sedutoras mãos:
“Diáfanos se faziam os séculos
ao afã da poesia e seus poetas.
Tênue translúcido despertar
— Enuncio lavradio da paixão.
Urgia a mais bela mulher.”)
e o deixar que a palavra se revele, há um abismo
imenso, intenso e único. O que esperamos, então?
Esperamos apenas que a Poiésis possa revelar-se,
íntima e intensa, como se fosse nossa esperança. Há, enfim, o Canto – e este
Cantabile de Paulo de Carvalho é um encontro com os sons e nomes (eidos) que se
nos aguardam ao pesarmos nossos desejos e nossas íntimas esperas. O Poeta, com
vistas à plenitude, divide o livro em quatro partes distintas e complementares
(Poemas para Ver, Cotidianos, O Traço Vazio, As Quadras Dela), anunciando uma
totalidade de formas, as quais nos remetem ao criador da palavra-mistério do
Nome que Cria: o poeta é o daimon, o mensageiro entre o Alto, do Belo pleno, e
os homens. Os poemas vão do amor-esperado ao Amor (em-si, ele-mesmo:
“Sou o que vejo no espelho,/ou o espelho
me vê?/no que sou?”)
correspondido à expectativa íntima da formação
do Mundo, como aquela máquina (referida por tantos poetas, como Camões)
misteriosa que nos rege e nos ergue. Um desejo de entrega e de desvelar o
Mistério.
Mas este livro consegue ir mais além dos
horizontes da poesia que nos é apresentada pelas academias e pelos poetas
“profissionais”. É um fazer no sentido pleno: a busca da palavra justa (le mote
juste de Flaubert) que se entrega e integra à essência da criação. Este
Cantabile é o Cântico da entrega do poeta em suas (nossas) expectativas várias.
Sejamos, nós, leitores, os amantes amantíssimos que jogam, sobre o tabuleiro,
peça a peça, os movimentos da conquista, como em Jogo de Xadrez:
“A dama, de branco trajada,
Tem a vantagem do lance.
Jogo de xadrez!”
ou sejamos, ainda além, estes seres preocupados,
intensamente, com o cotidiano que se nos apresenta prenhe de sentidos:
“Segue tua estrada,
Homem solitário!
Segue teu silêncio
Composto de azos e cinzas.
O céu já desvanece ao teu redor.
Não há mais a sarça
(E ainda assim te ardes).”
Mais: se temos de ser — sejamos mais e além: a
busca intensa do encontro com nossa essência (“Voa... Voa-me teus
escuros,/Macios, suaves, queridos lugares./Seduza-me vento, asas e sol”).
Enfim: a Palavra Criadora é uma só — a entrega do poeta ao Ser, o ente que se
vê e vê ao mundo como algo além de si, além da revelação terrena:
“Abstrair da palavra
A lavra silábica falada;
Plantar o verbo em hortas.
Mas não tocai o cio do solo.”
Cantabile é o cantar pleno da palavra. Assim
como o Poeta, o fazedor, no dizer de Borges, é o aedo que une (re/une?) todo o
Belo na forma do dizer a plenitude:
“Todo Verbo das tardes falavam outonais:
maciez dos sabores, botões das orquídeas,
matiz das peles: tez tênue, casta nudez.
Cultos solenes — Hinário dos sopros.”
A plenitude da Vida – e a vida é a palavra que
crê e cria: Crê em Calíope, que nos prende; Cria, como no princípio do Verbo.
*Fabio Ulanin é mestre em Literatura e
Crítica Literária pela PUC-SP. Professor universitário, poeta, autor dos livros
Animaquia (1997) e Kether (1999); teve poemas publicados em antologias na
Itália e na Suíça, além de artigos sobre literatura no Brasil e em Portugal.
Seu próximo livro de poesias, Bemidbar, encontra-se no prelo.
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