Acho piada ao modo como muitas pessoas reagem aos meus
textos mais contundentes. Acho piada porque essas mesmas pessoas, que apregoam
a moralidade e a verdade acima de tudo, doa a quem doer, não comentam os meus
textos de forma pública, de peito aberto, preferindo fazê-lo a coberto das
mensagens privadas que me mandam.
É evidente que tenho de respeitar esse querer dar-se
bem com deus e com o diabo. Só que essa não é a minha forma de estar na vida.
Se há algo de que posso orgulhar-me é de ser capaz de pensar pela minha cabeça
e dizer o que tenho de dizer, na hora que achar mais conveniente ou apropriado,
doa a quem doer.
Dito isto, e fazendo referência a uma das últimas
mensagens que recebi sobre o meu texto SOLIDARIEDADE ENTRE AUTORES, sinto ser o
momento adequado para esclarecer publicamente alguns equívocos, que pululam as
mentes dos menos atentos, sobre o meu comportamento.
Tenho sido acusado, entre outras coisas, de andar a
cuspir nos pratos onde tenho comido. Desconheço a exactidão das palavras que
andam de boca em boca mas é muito fácil para mim rebater essa acusação.
Em toda a minha vida, sempre soube separar o trigo do
joio e o facto de ter recebido ajuda, auxílio ou o que lhe quiserem chamar,
nunca me impediu, nem impedirá, de tecer críticas a comportamentos que
considero menos acertados. E as críticas que faço não apagam o reconhecimento
que tenho pelas pessoas e pelo que eventualmente possam ter feito por mim.
E se sou assim na vida também o serei sempre neste
universo da escrita.
O facto de Xavier Zarco ter sido um dos editores dos
meus primeiros livros nunca me impediu de discordar com algumas das suas
atitudes e não só o fiz publicamente como também olhos nos olhos. E apesar
dessas divergências também lhe soube reconhecer alguns méritos.
O facto de Paulo Afonso Ramos ter-me editado cinco
vezes, três das quais em condições excepcionais e inéditas, nunca me impediu de
falar, tanto publicamente como na sua presença, de aspectos relacionados com os
meus livros que poderiam ter sido melhor geridos. Apesar desses desencontros
sempre disse, e também de forma pública, do respeito que tenho pela forma como
está neste meio e pela forma como tem arriscado muito, a nível pessoal e não
só, em nome da cultura.
O facto de Paula Oz ter-me proporcionado a execução de
alguns trabalhos, remunerados, para a Edições Oz, numa altura complicada da
minha vida, nunca me impediu de tecer comentários, de forma pública e também
olhos nos olhos, sobre algumas situações em que considerei ser necessário
fazê-lo. Isso nunca invalidou que lhe reconheça enorme mérito no papel que tem
desempenhado na divulgação das obras de muitos autores.
O facto de Gonçalo Martins ter-me convidado para
publicar na Chiado Editora, em condições especiais e fora do comum, nunca me
impediu de tecer algumas considerações sobre a forma como está mal acompanhado
em alguns departamentos da editora. No entanto, nunca deixarei de lhe
reconhecer o mérito e a capacidade enquanto homem de negócios.
O facto de António Vieira da Silva ter-me convidado
para executar um trabalho para a Edições Vieira da Silva não me impediu de
tecer algumas críticas à forma como as suas antologias são elaboradas ao mesmo
tempo que lhe reconheço o trabalho que tem feito em nome dos livros.
O facto de Maria José Lacerda, da Editora Universus,
ter-me proporcionado a minha primeira apresentação no Porto, mesmo não sendo um
autor editado por si, nunca me impediu de tecer alguns comentários menos
abonatórios sobre alguns dos seus eventos, no entanto sempre lhe reconheci os
méritos do muito que fez pelos livros e pelos autores.
Posto isto, resta-me dizer que a gratidão que tenho
pelas atitudes, pelos gestos, pelas ajudas e pelos apoios que me deram nunca me
influenciarão na hora em que eu tiver de falar sobre aspectos e comportamentos
que possa considerar menos próprios. A gratidão manter-se-á sempre tal como a
rectidão e a frontalidade, porque estar grato não obriga a compactuar com o que se considera errado.
E se chegar à conclusão de ter sido injusto, então,
também saberei assumir, em público e cara a cara, o meu erro. Porque não me escondo
nos sussurros e nos comentários privados.
Enfim, eu e o meu estranho modo de estar na vida.
MANU DIXIT