quinta-feira, 12 de agosto de 2021

Sem excesso de futuro! - AGNETE SOMBRA

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Enquanto saboreava os algodões açucarados no João da esquina, contemplava as nuvens como névoas, que bailavam no céu da minha rua.
Gostava mesmo de saborear até o fim...
Sim, removendo os excessos grudentos que se escondiam nas minhas unhas crescidas de criança. Depois chupava o picolé de morango até aquele momento de olhar a mudança de cor do palito.
Talvez desejando ser aquele palito que abraçava o meu gelato preferido antes de mim. Ficava horas sem fim na frente do espelho, naquela única parte não oxidada, pelo excesso de umidade do banheiro. Agradecia pela cor róseo viva carimbada na minha língua.
E a rede estampada?
Ah, as suas cores confusas escondiam a sujeira matreira no solado dos meus pés.
Precisava esfregá-los na borda da minha canoa de punho, para que mamãe não brigasse quando os impulsionava na parede caiada, para que o arremesso fosse cada vez mais alto.
Maravilhoso o frio na barriga quando quase batia a cabeça no teto baixo da casa de três vãos. A simplicidade contagiante da vida de criança nutria cada dia como único, mesmo que as mesmas coisas fossem repetidas todos os dias.
O segredo estava em não colecionar o EXCESSO DO FUTURO que os adultos armazenam, tornando-os, às vezes, inábeis a desfrutar as muitas crianças que habitam como presente, no presente que eles transformam em futuro, sem ao menos vivê-los.

 EM - MULHERIO DAS LETRAS PORTUGAL (PROSA E CONTOS) - COLECTÂNEA - IN-FINITA

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