segunda-feira, 1 de março de 2021

Do senso comum ao bom senso (excerto) - ROSA ACASSIA LUIZARI

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Gabriel nasceu em noite conflituosa e me perguntei por que escolhi
ser mãe. A autorresposta fluiu como ocorre com o corpo feminino
quando deseja abrigar uma extensão.doc da própria vida.
Além de ser fruto de uma época em que as mulheres tinham a
maternidade como condição sine qua non, eu queria internalizar
o sentido de sê-lo, sair do senso comum e exercer meu bom senso
ao dar voz a uma nova vida. Eu queria descobrir o sentido de
materializar o desenvolvimento da extensão de meu corpo que,
ao mesmo tempo, não é meu. É outro.
Gabriel cresceu longe de mim, fato decorrente de minha separação.
Se estivesse comigo durante toda a infância, essa teria sido
tão conflituosa quanto a noite de seu nascimento.
Três anos foi tempo suficiente para Gabriel experimentar o
doce e o amargo de ser meu filho e de Renato. Nascido no intervalo
de nove brigas intensas, era uma criança alegre. Aproveitei
bastante o sorriso dele em meio às brigas que motivaram a minha
separação.
Eu era doutoranda em uma conceituada universidade e Renato
pensava que isso fosse perda de tempo. Não era. Conquistei
meu espaço. Resolvi que em minha vida tudo seria uma sucessão
de avisos prévios concedidos a mim por mim mesma. Só não o
era a rejeição de Renato em relação a Gabriel.
Quando a mistura de nossas personalidades veio ao mundo,
nenhum sorriso ou foto. Na memória do pai, apenas o fato.
Ainda bem que as mães registram o nascimento de seus filhos de
um modo diferente dos homens. Não precisam de fotografias. O
calor da extensão de seus corpos é a certeza de que o filho está ali
e de que tudo se renova.
Gabriel foi um bebê muito amado por mim e por Renato. Ele
amava o nosso filho. Do jeito dele.

EM - MÃES - COLECTÂNEA - IN-FINITA

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