O faroleiro
Franclim sentiu ter encontrado a profissão ideal para as características mais óbvias do seu feitio.
Sempre gostou de ficar num canto com os seus pensamentos, longe do conflitos e arrelias permanentes de um escritório. Sempre desejou entrelaçar responsabilidades e lazer sem horas marcadas para coisa alguma. Enfim, organizar o tempo a seu bel-prazer, dividi-lo entre obrigações e o que lhe desse na gana, e envelhecer ao ritmo da vida, com paz e tranquilidade.
Aquele trabalho, de faroleiro, encaixava como uma luva nas suas pretensões.
O que Franclim não sabia, e descobriu com o tempo, é que nem os espíritos livres, por mais independentes que sejam, são compatíveis com a agressividade do sal ou a corrosão das lágrimas.
Hoje, passados trinta anos a iluminar as noites dos navegadores, Franclim não reconhece a face que o espelho reflete. A pele ressequida pela salinidade das marés tem rugas, em forma de desfiladeiros, por onde correm, amiúde, as saudades da família, que só vê uma semana em cada três meses.
EMANUEL LOMELINO
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