Diário do absurdo e aleatório
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Leónidas respirou fundo para aplacar o seu estado de fúria, por ter sido obrigado a faltar ao trabalho, para uma reunião com o diretor de turma do seu filho.
Apesar de ser um aluno exemplar e ter excelentes notas, o professor informou que, há algumas semanas, após as aulas, Lúcio não tomava o caminho de casa e dirigia-se para o acampamento de sem-abrigos, que ficava no outro extremo da cidade. Perante o facto, sentiu-se na obrigação de alertar o progenitor.
Com o intuito de não ser precipitado no julgamento e saciar a curiosidade que aquela revelação havia suscitado, Leónidas decidiu investigar mais a fundo as actividades do filho. Esperou o fim das aulas e seguiu-o. Tal como o professor tinha dito, Lúcio não foi direto para casa e encaminhou-se para o lado oposto.
Chegado
ao acampamento, Leónidas viu como algumas crianças maltrapilhas rodearam o seu
filho e o acompanharam para o interior de uma tenda, tão miserável quanto eles.
Quando tentou aproximar-se para descobrir o que estava a acontecer, foi interpelado por um sujeito. O vozeirão do homem suou como um alarme e, rapidamente, Leónidas viu-se rodeado por alguns sem-abrigo.
Apesar da fúria, mas em inferioridade, explicou a sua presença naquele local e foi surpreendido por uma clamorosa manifestação de reconhecimento por ser pai de quem era.
Leónidas perdeu o soldo de um dia de trabalho, mas ganhou a consciência de ter um filho que, de forma altruísta, sigilosa e desinteressada, passava uma hora do seu dia a ensinar crianças desfavorecidas que não tinham possibilidades de frequentar a escola.
EMANUEL LOMELINO
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