Em Dezembro de 2011, a convite da minha amiga Manuela Fonseca, fiz duas apresentações do seu livro infanto-juvenil, NA QUINTA DO TIO TOMÁSIO E OUTRAS HISTÓRIAS. Se na primeira o meu discurso foi mais tradicional, na segunda fiz questão de fugir um pouco aos formalismos próprios destas ocasiões e escrevi este texto, inspirado pelo próprio conceito do livro, para grande surpresa geral, mas acima de tudo da autora.
Era uma vez (assim começavam quase todas as histórias
da minha infância) uma menina de laçarote no cabelo e olhos brilhantes como uma
noite de lua cheia. Esta menina era igual a todas as meninas da sua idade com
excepção de um pequenino pormenor, sonhava mais que as outras meninas e
acreditava nos sonhos tornados realidade. E gostava tanto de sonhar que fazê-lo
enquanto dormia não era suficiente, então, passou também a sonhar acordada. E
sonhava tudo o que queria, quando lhe aprazia. Quando estava a auxiliar nas
lides domésticas sonhava que era a Gata Borralheira, baixava a cabeça e
colocava no rosto um ar muito sofrido como se estivesse a limpar o pó ou a
lavar a loiça sob coacção. E quando se arranjava para sair à rua imaginava que
a seus pés estava um príncipe a colocar-lhe um sapato de cristal.
Quando punha os pratos na mesa, sonhava que era a
menina perdida no bosque e que tinha acabado de entrar numa casa onde tudo
existia em três tamanhos diferentes.
A nossa menina não parava de sonhar. Umas vezes era a
Alice no país das maravilhas, outras vezes era a Cinderela, de quando em quando
brincava com o Pinóquio ou com o Mogli, falava com os animais e eles
respondiam.
Ao mesmo tempo que sonhava, a menina de laçarote no
cabelo e olhos brilhantes como uma noite de lua cheia, também crescia. Cresceu
tanto que se transformou numa adolescente de fita no cabelo e olhos brilhantes
como uma noite de lua cheia. Esta adolescente era igual a todas as adolescentes
da sua idade com excepção de um pequeno pormenor, sonhava bem mais que as
outras adolescentes e ainda acreditava nos sonhos tornados realidade. E gostava
tanto de sonhar que continuou a fazê-lo de noite e de dia. Quando se deitava
para dormir, sonhava que era a Bela Adormecida e que de manhã despertaria ao
ser beijada por um belo príncipe. Na camioneta, a caminho da escola, sonhava
que estava a cavalgar um unicórnio e na escola sonhava que estava rodeada de
anões, duendes e trolls. Quando regressava a casa era a vez de vir no dorso de
um dragão alado. Quando se apaixonou pela primeira vez imaginou que ao beijar o
seu namorado este se iria transformar num belo príncipe que a levaria para
terras do sul e ao vê-la entristecida pelas saudades das terras do norte
plantaria amendoeiras que depois de floridas a alegrariam.
Ao mesmo tempo que sonhava, a adolescente de fita no
cabelo e olhos brilhantes como uma noite de lua cheia, também crescia. Cresceu
tanto que se transformou numa bela mulher de chapéu no cabelo e olhos
brilhantes como uma noite de lua cheia. Esta mulher era igual a todas as
mulheres da sua idade com excepção de um grande pormenor, sonhava muito mais
que as outras mulheres e embora sabendo que nem todos os sonhos se tornam
realidade nunca desistiu dos seus e concretizou alguns.
Hoje, já não sonha que brinca nos Alpes com o Pedro e
a Heidi, tampouco sonha correrias ao lado da Pipi das meias altas, já não
conversa com o Gato das botas nem com o Grilo Falante. Os seus sonhos mudaram
tal como mudaram os adereços do seu cabelo. Só a vontade de sonhar e os seus
olhos brilhantes como uma noite de lua cheia se mantêm inalteráveis. Hoje já
não sonha brincadeiras com os personagens das fábulas que a acompanharam toda a
vida porque o seu sonho, aquele que agora quer concretizar, é ser autora de
novas fábulas, inventar personagens e dar a cada criança a possibilidade de ser
feliz na construção dos seus próprios sonhos.
Aquela que foi menina de laçarote no cabelo,
adolescente de fita no cabelo e agora é mulher de chapéu no cabelo, toda a vida
teve olhos brilhantes como uma noite de lua cheia, nunca deixou de acreditar
nos sonhos realizáveis e está aqui ao meu lado a cumprir o seu sonho.
Lisboa, 8 de Dezembro 2011
Obrigado, querido amigo Manu!
ResponderEliminarForam momentos muito especiais.
Um beijinho de saudades.
Manelita
Manelita! Gosto muito desta foto porque retrata na perfeição a forma como reagiste quando a meio da história te coloquei o chapéu na cabeça, e ao mesmo tempo dá para ver a reacção do Paulo, que foi igual à de quem assistiu ao evento.
EliminarBeijocas grande, amiga.
Adorei, Emanuel!
ResponderEliminarUma história bem ao meu gosto, com os «ingredientes» que mais apelam à minha natureza (também ela sonhadora, otimista e crente). Não sei como reagiu a sua amiga, mas eu teria provavelmente rido de deleite e chorado de comoção. Muito bom!
Beijinhos,
Marta.
Marta! A história desta apresentação ganha outros contornos se adicionares o facto de eu, durante toda a semana anterior ao evento, ter andado a pressionar a Manuela para levar aquele chapéu. O adereço foi peça fundamental para dar mais impacto ao que escrevi. Só quando mencionei o chapéu (colocando-o na cabeça dela) é que as pessoas se aperceberam de quem eu estava a falar. Foi muito giro ver as reacções. Aliás podes ver o ar deles na foto (tinha acabado de pôr o chapéu na cabeça da Manuela).
EliminarBeijo
Parabéns à Manuela pelas "Historinhas" de que todos gostamos.
ResponderEliminarParabéns ao Manuel pela sua dinâmica e envolvência em projetos culturais!
Um abraço a ambos.
Votos de muitos sucessos!
Conceição!
EliminarObrigado pelas palavras.
Emanuel
Eu estive no lançamento. Momentos únicos.
ResponderEliminarEsse foi outro evento muito emotivo!
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