sábado, 22 de julho de 2017

FALA AÍ BRASIL... ADRIANA MAYRINCK

A chama invisível queimava e crepitava em meu pensamento por horas seguidas, enquanto eu ardia no inconformismo do meu ser. Percorro pelo espaço de egos e ecos, desde quando me fiz pertencer ao mundo das artes, seja produzindo, participando ou observando.

E a incoerência nisso tudo, é que no universo, em que a sensibilidade e o ser são a expressão máxima para a criação, seja ela na poesia, pintura, música, ou qualquer outro movimento literário ou cultural, é onde a banalidade, a pequenez e a futilidade do humano, se expandem de forma nem sempre óbvia, mas crescente.

Donos do mundo e da verdade, por terem o dom divino do encantamento, creditam e ditam aos pobres mortais que apreciam e se deixam envolver, a ditadura do EU.

Há décadas atrás, a vida pública daquele que detinha esse dom de professar a arte, era certificada ao ultrapassar o limite das fronteiras, do tempo, e só dominava outros espaços com talento comprovado por obras avaliadas pela crítica especializada, fã clube presencial, e análise de mercado.

Sigo por anos intermináveis, artistas de diversas formas, acreditando na eternidade da boa arte e aprecio esses gênios que foram capazes de superar o limite do tempo, com o esforço, inspiração, transpiração e talento para hoje fazerem jus ao título e nome que carregam.

Mas a era da comunicação invadiu o intervalo entre a coerência, a construção, a obra, a criação, e transformou qualquer palavra em poesia, qualquer livro em bestseller, qualquer músico em personalidade, qualquer pessoa em autor, qualquer artista em famoso, e qualquer pintura em obra de arte.

Sou aberta a todas as formas de expressar o que transborda da alma, e acho que o ser humano tem todo o direito de fazê-lo, e defendo isso, dentro dos limites que esse novo tempo não determinou. Mas cá entre nós, essa janela para o mundo não é para “todos”.

Uma postagem nas redes sociais e todos são venerados e aplaudidos nos bastidores invisíveis do quem tem mais curtidas e seguidores. E intrinsecamente legitimam, sem critérios, quem é ou não senhor do universo artístico ou literário, pelo menos naquele espaço que circula e dá voltas por todos os continentes.

E nos bastidores, ah, o circo é montado e por todos os lados, tapetes estendidos, também são puxados, em um piscar de olhos, na cadeira reservada para que o amigo menos talentoso, mas vantajoso, possa ocupar para o segundo de flashes e postagens firmarem a notoriedade daquele instante. Alguns olhares mais atentos e éticos observam silenciosamente, o burburinho que se alastra igual rastilho de pólvora, no disse-me-disse que circula, no ar que sufoca e abafa verdades.

Academias de letras aceitando semianalfabetos, autores despreparados, atores inexpressivos, exposições fotográficas registradas por celular, livros mal editados, compositores desacertados, cantores desafinados, jornalistas então... nem comento. Postam um vídeo aqui, um texto ali, e são aclamados. Produtores que fazem qualquer evento, superlotando o espaço, sem a responsabilidade com as vidas humanas, sem certificação e vistoria.

E por essas e outras, nessa era digital, caminha-se para a banalidade da expressão artística e cultural, onde todos são o que desejam, só porque se olham no espelho e decidem, e aquele amigo solidário curte e partilha, e assim nasce, quando menos se percebe, um deus ou deusa crepitando nas brasas da suposta e momentânea fama, criada para ser extinta minutos depois... ou não.


Até onde vai o limite do ser criador... E nós, até onde permitimos conduzir a perpetuidade do belo, do legítimo, da arte, nesse clicar de curtidas instantâneas, jogando mais lenha na brasa que surgiu para ser apenas... cinzas.

DRIKKA INQUIT

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