segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

EU FALO DE... MOMENTO AGRIDOCE


Para quem acompanha, com alguma proximidade, o que é editado, é fácil perceber que a grande maioria dos autores limita-se a transformar em livro um punhado de poemas escritos durante um determinado período de tempo (normalmente reduzido), sem qualquer tipo de preocupações, sejam de natureza técnica, estilística, ou temática. Mas isso é matéria para outro filme.

É minha convicção que um autor, para além da vertente criadora e criativa, deve possuir uma apurada capacidade de intuir quando um trabalho está terminado ou exige continuação. Evidentemente, este pressuposto depende, sobremaneira, dos objectivos e natureza da obra criada e/ou a criar.

Apesar do elevado grau de auto-exigência que sempre tive, confesso que, somente após ter começado a escolher os textos para o meu primeiro livro, senti a necessidade de repensar a forma como agrupava as minhas criações. O mesmo é dizer: só comecei a dar importância ao valor do todo quando confrontado com a perspectiva de editar.

Essa forma de raciocínio explica, não só, as linhas mestras de cada um dos sete livros que editei, mas também, todos aqueles que tenho guardados para possível edição.

Já me ouviram dizer muitas vezes: eu não escrevo porque edito, eu edito porque escrevo. Tendo em conta esta máxima e o facto de, felizmente e contra o vaticínio de muitos, continuar a receber convites para editar, tenho tido a preocupação de emprestar alguma coerência e linha condutora em cada uma das propostas que, entretanto, tenho produzido.

No entanto, e ao contrário do que alguns pensam, eu não me sento em frente ao computador num determinado momento a escrever um livro de rajada; o eclectismo que existe em mim não o permite.

Eu vou escrevendo o que tenho a escrever no momento, e apenas na hora de guardar o texto é que surge a decisão de o colocar neste ou naquele ficheiro, o mesmo é dizer, só depois de terminado o poema é que decido em que possível livro é que ele encaixa melhor. Também sendo verdade que muitas vezes não encaixa em lugar algum, seja por não ter o grau qualitativo que me auto-exijo, seja por estar desenquadrado com as temáticas e/ou estilos que requerem complementaridade.

Porém, há alturas em que um poema, apesar de corresponder aos critérios de um determinado projecto, cria em mim um sentimento agridoce que passo a explicar e é a razão primeira para toda esta dissertação.

Não sendo uma situação virgem, creio que nunca abordei esta questão e desconheço se o mesmo acontece com outros autores.

Falo daquele momento em que encaixo um poema no projecto de livro que julgo mais adequado e, ao reler o todo, nasce a sensação que não há mais nada a acrescentar a esse projecto, tendo chegado a hora de o dar por terminado e colocá-lo na "gaveta" à espera de uma oportunidade para ser transformado em livro.

Foi o que aconteceu hoje quando terminei de escrever o primeiro poema deste ano e o fui colocar num projecto que tem o nome, talvez, provisório: VERDADES INDUZIDAS. Ao reler a totalidade dos textos que coloquei neste esboço de livro, dei-me conta que não há mais nada que eu possa acrescentar a este trabalho que iniciei há mais de três anos.

O sentimento agridoce de que falo deve-se ao facto de conseguir saborear o momento em que dou por terminado este trabalho sem, contudo, deixar de sentir também a certeza que estará relegado a uma espera sem tempo.

Resta, tal como em momentos anteriores e outros que virão, esperar que apareça a sua hora e começar a dar vida a outros esboços de livros, porque ideias não faltam.


MANU DIXIT

domingo, 8 de janeiro de 2017

EU FALO DE... ENSAIOS E SENTIRES POÉTICOS

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO POR CHIADO EDITORA
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Diz-me a experiência, de alguns anos de contacto com autores, que muitas vezes, para não dizer a maioria das vezes, o discurso não combina com o ofício. Essa discrepância ocorre quase sempre quando conhecemos o autor antes da obra. Por isso, só é possível esclarecer sobre a existência desse diferendo quando nos embrenhamos nos trabalhos e comparamos com as palavras que ouvimos da boca do(s) autor(es). Sendo perfeitamente normal que os discursos levem à criação de algumas expectativas, exige-se um certo distanciamento e capacidade de análise imparcial aquando das leituras.

Serve esta linha de raciocínio para falar-vos do livro ENSAIOS E SENTIRES POÉTICOS do poeta Celso Cordeiro.

Cruzei-me diversas vezes com este autor em tertúlias e, através das conversas, dei conta de estar na presença de alguém que tem bem definidas as suas percepções sobre a poesia e rege o seu ofício com directrizes coerentes e pensadas pela própria cabeça (ao contrário do que acontece com a generalidade dos autores).

Perante esta minha avaliação feita ao discurso, nasceu-me a curiosidade sobre a sua obra e, aproveitando a parceria com a Chiado Editora, pedi que me enviassem o seu último trabalho para o divulgar e analisar.

Desde o primeiro texto, tornou-se evidente para mim estar perante um livro que encaixa perfeitamente no perfil que havia criado. Cada poema encerra em si mesmo as ideias transmitidas e defendidas pelo autor, sobre a arte de criar poesia. A coerência, entre o discurso e os poemas, é indesmentível e isso, por si só, dá um cunho de originalidade e autenticidade à obra, no seu todo.

Entre outros aspectos, não menos importantes, existem dois que se destacam e merecem ser mencionados:

Em primeiro lugar, o domínio do autor na utilização mesclada de elementos antigos com outros modernos. Nomeadamente o uso de linguagem actual, simples e sem a busca frenética e desequilibrada pela rima, dentro de estruturas clássicas, com forte predominância das estrofes em detrimento das estâncias. Com a consciência, evidenciada, que o discurso escrito, vulgo poema, não obriga à utilização dogmática de sintaxe diferente da usada no discurso oral. Esta faceta menos técnica na hora de criar facilita, aquilo que me parece ser uma imagem de marca do autor, uma maior aproximação e identificação entre os leitores e o poeta.

Em segundo lugar e porque é uma qualidade pouco vista nos dias de hoje, devo referir a grande capacidade de síntese demonstrada pelo autor. O mesmo é dizer que me agrada sobremaneira um livro composto por poemas curtos mas decididamente esclarecedores, em contraponto aos "lençóis" escritos por grande parte dos autores.

Para terminar, resta-me deixar expresso o quanto me apraz ter encontrado alguém com consciência de autor mas que, ao invés da maioria, dá-lhe uso. Por tudo isso, recomendo vivamente a leitura de ENSAIOS E SENTIRES POÉTICOS de Celso Cordeiro.

MANU DIXIT