domingo, 30 de outubro de 2016

EU FALO DE... ROMANTISMO


Na sequência da análise crítica que fiz ao livro Antologia do Silêncio, de Susana Inês, e depois de ler alguns textos sobre o que é, pode e deve ser considerado poesia, achei apropriado pegar no tema e fazer algumas reflexões/considerações.

Tirando os aspectos históricos e ideológicos, o romantismo, enquanto corrente literária, baseia-se na oposição absoluta à utilização das regras dos clássicos (no caso da poesia: métrica e rima).

Se tivermos em linha de conta, apenas e só, este aspecto técnico somos obrigados a reconhecer que a esmagadora maioria dos autores actuais pertence à corrente romântica. No entanto, o romantismo exige um pouco mais de critério e, para separar o trigo do joio, existem mais alguns parâmetros, a serem respeitados, para que um autor possa ser considerado romântico.

Logo à partida, e talvez por isso uma das características mais utilizadas, uma visão do mundo muito centrada no indivíduo, roçando, quase como modus operandi obrigatório, o egocentrismo exacerbado.

Noutra perspectiva, o romantismo tem sempre de incluir um elevado grau de subjectividade alicerçado num profundo e constante sentimentalismo emocional.

Outra das características definidoras do romantismo é a interacção do autor/criador/eu poético com os diversos elementos da natureza.

No fundo, e de um modo mais redutor e simplista, o romantismo, como corrente literária, exige que os seus aficionados revelem um idealismo subjectivo com forte ligação à natureza, de forma egocentrista, negando sempre as regras estéticas dos clássicos.

Através desta minha definição rústica, qualquer um consegue identificar de imediato a ligação de muitos autores actuais com esta corrente literária e "etiquetá-los" com o romantismo.

Contudo, especialmente na poesia, e fazendo uso de um adágio popular, "nem tudo o que parece é". Grande parte dos autores, cuja escrita contém os elementos exigidos pelo romantismo, estão a incorrer no auto-engano pelo mero facto da sua escrita ser tudo menos poesia, porquanto, nem mesmo o romantismo consegue fugir ou contornar aquilo que é essencial na poesia: qualidade da escrita, coerência do discurso, elementos estéticos e, acima de tudo, componente filosófica.

Muitos argumentam que a subjectividade exigida no romantismo permite ignorar estes aspectos. Outros dirão que a recusa das regras justificam o incumprimento destes requisitos. Puro engano meus senhores.

A componente subjectiva do romantismo limita-se ao discurso dos textos e não aos conceitos de qualidade e a negação das regras aplica-se apenas à inexistência de métricas e rimas. Tudo o resto continua a ser imprescindível. 

Se assim não for não pode ser considerado poesia.

MANU DIXIT 

domingo, 23 de outubro de 2016

EU FALO DE... O ESPASMO HÍPNICO DOS LÍRIOS

Saibam mais do livro neste link

Hesitei bastante (três meses) antes de escrever algo sobre este livro porque há livros que nos deixam indecisos pelo arrojo da contradição.

Existem livros que nos matam a sede de boa escrita e deixam-nos a garganta seca. Existem livros que nos adoçam a boca e deixam-nos um rasto amargo nos lábios. Existem livros que nos conquistam a alma mas deixam o coração estilhaçado. Há livros assim.

Eu não gosto de livros escritos em dois géneros distintos mas gosto da poesia e da prosa deste livro. Gosto porque a poesia me acaricia e a prosa me chicoteia, e gosto porque o inverso também é verdadeiro.

Gosto de O ESPASMO HÍPNICO DOS LÍRIOS, de Apeles Heleno, porque no seu interior as palavras são mais que simples palavras. Gosto deste livro porque as suas palavras são oásis e deserto, água e vinho, mel e sangue, flor e raiz, semente e fruto. Gosto deste livro porque as suas palavras são vida e morte, cor e escuridão, terra e céu, inferno e paraíso, corpo e espírito. Gosto deste livro porque as suas palavras são carícia e agressão, grito e silêncio, certeza e delírio, molde e improviso, tudo e nada.

Gosto deste livro porque o muito que tenho a dizer dele posso fazê-lo em poucas palavras. Há livros assim.


MANU DIXIT 

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

EU FALO DE... ANTOLOGIA DO SILÊNCIO

Saibam mais do livro neste link

Confesso que não sou apologista, nas análises que faço aos livros que leio, à identificação das correntes literárias onde, porventura, esses mesmos livros possam ser encaixados. Só não assumo essa inabilidade como «aversão» porque a definição do termo, nos dicionários de língua portuguesa, reporta para o ódio/repugnância e, no meu caso, é mera antipatia pela tarefa por acreditar que esse género de análise tem mais sentido quando feita dentro de perspectivas académicas. Eu limito-me a identificar aquilo que considero boa ou má escrita, respeitando sempre as minhas próprias definições e parâmetros de qualidade. Faço esta confissão como alerta para os mais "literais" que, muitas vezes, não entendem o alcance do que escrevo, dando-lhe conotações excessivamente clássicas. Não tenho essa pretensão!

Serve o parágrafo anterior para justificar a distinção que faço entre o romantismo como corrente literária, onde se inclui a generalidade dos autores da modernidade (mesmo sem o saberem), e o romantismo enquanto forma de discurso de carácter sentimental (usado até à exaustão pela quase totalidade dos autores de hoje).

Posto isto, quero falar-vos do livro ANTOLOGIA DO SILÊNCIO de Susana Inês que considero apropriado ser incluído no universo do romantismo, que não a corrente literária, embora tenha as características ideais para também o ser.

Não sendo um grande livro (nem mesmo no tamanho) é um bom manual de como escrever sobre sentimentos de um modo distinto da norma. Enquanto a maioria faz uso abusivo de clichés e discursos insossos e pouco originais, a autora deste ANTOLOGIA DO SILÊNCIO consegue fazer uma abordagem mais imagética com recurso a instrumentos linguísticos que raramente vemos serem utilizados, nomeadamente as figuras de estilo. Exemplo perfeito do que acabo de referir pode ser observado logo no poema inicial:

PORTA DE ENTRADA

Na minha porta de entrada
Há sempre uma vista
Para uma janela
Mais súbita e intensa,
Para um sonho mais sábio
Que aspira à sarça da confiança.
E se a realidade
não for aquela que se deseja,
a porta de entrada
verá a janela do Presente
e se a janela não bastar
o Sol desvenderá, ao longo da estrada
a chave para aflorar
o sorriso da gente.

ou ainda, mais adiante:

MÃOS DE SOL

Encaras a vida com armas de brilho,
Braços de árvores e mãos de Sol.
Digeres as palavras
Como se te alimentasses
Somente delas e da Alma que elas te trazem.
A seiva, o oxigénio, a vida,
A explosão acesa em cada cítara
Que ouves harpeando no eco do teu cogitar,
É a certeza gradual que contempla
O compasso da melodia
Que escutar-se-á além-mar.

e a componente romântica:

RECOLHER

O recolher imprevisto
Do beijo que tocou
O começo da noite,
Onde a ânsia não se aquieta.
As mãos prenderam mas não disseram
Mais nada que não a dimensão do gesto!

E mais exemplos poderia dar mas correria o risco de transcrever integralmente o livro, e não é isso que se pretende.

Creio não estar muito longe da verdade se disser que, com este trabalho, a autora pretendia levar os leitores numa viagem pelos silêncios, que só a palavra escrita nos pode proporcionar. De modo geral pode ter conseguido mas, para mim, a sua grande conquista, senão o maior atributo deste livro, é ter emprestado um enorme cunho de originalidade na maioria dos textos apresentados e, com esse simples acto, provar que ainda há margem de manobra suficiente, para se ser criativo, para todos aqueles que negam entregar-se a uma só fórmula; a uma única abordagem.


MANU DIXIT

segunda-feira, 17 de outubro de 2016

EU FALO DE... NOVO MOTOR DE BUSCA


Ao longo dos seis anos como utilizador do Facebook, tenho tentado manter-me fiel ao princípio de não embarcar nas agitações em massa que regularmente acontecem nesta plataforma. Procuro, na medida do possível e sem negar algumas falhas pelo caminho, distanciar-me propositadamente desses movimentos colectivos que são, muitas vezes, inócuos e que não acrescentam nada a cada um de nós. No entanto, sempre que aparece um destes fenómenos, faço a minha pesquisa sobre o assunto, porque o saber não ocupa lugar, e depois, se achar pertinente, escrevo algo sobre a matéria.

Confesso que, quando li as primeiras referências e este motor de busca com a suposta maior base de dados sobre escritores portugueses, não dei muita importância porque habituei-me a utilizar o Google como ferramenta de pesquisa. Contudo, ao ver o enorme alarido que começou a ser feito nos últimos dias, e depois de ler um texto do poeta Victor Oliveira Mateus, sobre o assunto, decidi ver pelos meus próprios olhos do que se tratava.

Para variar comprovei, o que sempre acontece nestas ocasiões: a publicidade é melhor que o produto.

Em primeiro lugar, só alguns dos autores referenciados tiveram direito a biografia exaustiva e bibliografia completa... não será difícil de perceber que esses são os mais mediáticos.

Em segundo lugar, e para mim mais relevante, esta até pode vir a ser a maior e mais completa base de dados de escritores portugueses mas neste momento está bem longe desse objectivo. Bastou-me procurar meia dúzia de autores; Casimiro de Brito, Graça Pires, Paulo Themudo, Pedro Tamen, Lídia Borges, António Ramos Rosa, para chegar a essa conclusão.

Repito, este motor de buscas até pode vir a ter, um dia, a maior base de dados sobre escritores portugueses mas neste momento até a falível e inconfiável Wikipédia tem uma base de dados mais completa.

Vejam pelos vossos próprios olhos em escritores.online


MANU DIXIT

domingo, 16 de outubro de 2016

EU FALO DE... PRÉMIO NOBEL


Não me recordo de alguma vez ter assistido a tanta comoção pela entrega de um prémio, como aconteceu após a divulgação do novo Nobel da Literatura.

Tal como, infelizmente, tem vindo a acontecer na nossa sociedade, e cada vez com mais frequência, não houve meios termos e as posições foram quase todas de extremos, algumas roçando o ridículo. Contam-se pelos dedos de meia mão os argumentos minimamente coerentes usados tanto de um lado como de outro.

Como não me revi em nenhum deles, senti necessidade de expor a minha opinião que, vale o que vale, é apenas isso mesmo, mais uma opinião. 

Em primeiro lugar quero dizer que, ao contrário de muita gente, eu não creio que se tenha aberto uma caixa de Pandora ao atribuir este galardão a um músico, porquanto o prémio é para o poeta Bob Dylan e não para o "tocador de harmónica". Por isso descansem os intelectuais puritanos que não veremos o mesmo acontecer com o Michael Bolton ou o Elton John.

Por outro lado, temos de ter em atenção que uma coisa é poesia e outra, bem distinta, são os poemas de canções. Há sempre tendência para não saber distinguir uma coisa da outra. Infelizmente, são poucos os músicos que escrevem poesia. Entre esses posso referir dois nomes da lusofonia que, na minha opinião, podem ser apelidados de poetas pela riqueza literária das suas obras: Chico Buarque e Sérgio Godinho.

Um dos argumentos que mais me chamou a atenção foi que Bob Dylan sempre se apresentou como músico e nunca como poeta. Pois bem, podem acreditar, aqueles que se auto-intitulam poetas raramente o são. Ser poeta não é um estatuto de auto-proclamação mas sim um estado de aceitação que é concedida pelos outros através desse epíteto.

Para aqueles que duvidam, embora sem argumentação capaz e válida, que Bob Dylan está longe de ser um poeta, recordo-vos o filme Dangerous Minds, com a sensualíssima Michelle Pfeiffer, em que a poesia do novo Nobel é estudada em paralelo com o popular, mas não galardoado, Dylan Thomas. Poucos sabem mas o filme foi baseado em factos reais e a poesia de Bob Dylan serviu mesmo para mudar algumas vidas que, de outro modo, estariam irremediavelmente perdidas.

Para terminar quero deixar expresso o meu regozijo por todo o folclore em redor da atribuição deste Nobel da Literatura, pois revela que, quando o galardoado é conhecido do grande público, ao contrário da maioria dos anteriores, as massas sentem-se na obrigação de dizer algo, só porque sim. E isto nunca poderia acontecer com outro Nobel que não o da Literatura.

MANU DIXIT  
  


sábado, 15 de outubro de 2016

DEZ PERGUNTAS A... MARIA ANTONIETA OLIVEIRA

Um agradecimento especial, pela disponibilidade e prontidão de MARIA ANTONIETA OLIVEIRA, autora de GALERIA DE AFECTOS (poesia), ENCONTRO-ME NAS PALAVRAS (poesia) e PARA ALÉM DO TEMPO (romance)

1 - Enquanto poeta como explica a origem da sua poesia?
-         Não sei explicar. A poesia surgiu sem que eu saiba como, no último ano de curso, quando pensámos dar um pergaminho com quadras representativas de tudo o que se passara ao longo do ano, nas aulas de contabilidade. Cada uma de nós tentou descrever uma situação, eu de igual modo o fiz e aí nasceram as minhas primeiras quadras. Nesse mesmo ano de 1964 surgiram os primeiros poemas, todos dedicados a alguém ou algo de que gostava. E a poesia continuou ao longo da minha vida.

2 - Qual a maior dificuldade que encontrou quando deu os primeiros passos no universo da escrita, nomeadamente na divulgação pública da sua poesia?
-         Bem, nos anos sessenta do século passado era impensável uma desconhecida publicar um livro. Internet também não havia, portanto os meus leitores eram os familiares e os colegas de trabalho. Mais tarde entrei no mundo dos locais onde se escrevia e comentava e a partir daí tudo foi diferente.

3 - As redes sociais tiveram algum impacto (positivo ou negativo) na sua produção criativa? Explique.
-         Depende do ponto de vista. Se não fossem as redes sociais aonde comecei a postar o que escrevia, ainda hoje não tinha algum livro publicado. Por outro lado não foram as redes sociais que modificaram a minha forma de escrever. Penso ter respondido e explicado.

4 - Qual a importância das antologias e colectâneas no seu percurso?
-         Foi muito importante, pois pelas antologias e colectâneas, comecei a ver em livro poemas escritos por mim. Só dois anos depois da primeira antologia, surgiu o meu primeiro livro de poesia.

5 - Sentiu alguma diferença no seu modo de escrever depois de ter editado o primeiro trabalho individual?
-         Claro que sim. No primeiro livro publiquei muitos dos meus primeiros poemas, quis deixar em livro esses outros tempos de escrita, em que homenageava a minha família, a minha existência, os meus amores. Hoje em dia a poesia surge sem que eu saiba como ou porquê, sem dedicatória, motivo ou razão.

6 - Até 2014 conhecíamos apenas a sua vertente poética. De repente surge com um romance. Foi algo previamente planeado ou fruto de uma evolução que considera natural?
-         Não, não foi planeado. O tema do meu romance é algo que me suscita interesse, ou não fosse o amor, eu que sou uma romântica incorrigível. Um tema abordado e debatido na TV e em certas revistas, que eu ouvia e lia, de repente ao falar com uma pessoa amiga sobre vários testemunhos acerca do assunto, ela sugeriu-me a feitura de um romance. Foi a gota de água que faltava para me dispor a fazê-lo. Já depois de muitas páginas escritas, li e duvidei que alguma vez pudesse sair em livro. Também em conversa com um amigo, que veio a ser o prefaciador do mesmo, ele sugeriu que lhe enviasse o que já tinha escrito e me daria a sua opinião. Foi o que fiz e o livro está nas livrarias.

7 - Em que registo se sente mais confortável? Porquê?
-         Na poesia. A poesia surge sem que eu lhe peça para chegar. O romance não foi assim, inclusive obrigou-me a pesquisar para tornar mais reais certas situações.

8 - Para além do tempo foi um livro que provocou diferentes reacções, por parte dos leitores. Como lidou com essa circunstância?
-         Da melhor maneira. A partir do momento em que passou para o leitor deixou de me pertencer, assim sendo, cada um que lhe dê a importância e a interpretação que melhor lhe aprouver. Digo-te até, que perdi e ganhei amizades.

9 - Depois de dois livros de poesia e um romance, podemos esperar a incursão noutros géneros literários?
-         Não estou a pensar em nada diferente, mas “nunca digas nunca”

10 - Em jeito de balanço, quais os pontos positivos e os negativos que mais destacaria sobre o universo da escrita?

-          Esta pergunta daria muitas páginas para uma resposta concreta. Limito-me a dizer que, como em tudo na vida, há bons e maus momentos, temos que saber aproveitar os bons. E é com esta frase que termino o meu romance “a felicidade são momentos”.

quinta-feira, 13 de outubro de 2016

EU FALO DE... NEM MESMO SOSSEGADO NO MEU CANTO

Uma das coisas mais valorosas que aprendi, pela educação de berço, foi pensar pela minha cabeça e defender, com frontalidade e honestidade, os meus princípios, independentemente das consequências que daí pudessem advir.

Tenho plena consciência que, tal como em outros aspectos da vida quotidiana, também no universo da escrita, do qual faço parte desde 2008, então apenas como mero elemento observador, esta minha postura nem sempre foi considerada positiva; prova disso são os inúmeros "desencontros" com autores e/ou editores. No entanto, e mais uma vez, por educação de berço, sempre encarei esses episódios como algo natural mas sem dar mais importância do que aquela que os mesmos tinham.

Admito que poderia, em alguns momentos, ser menos incisivo, menos mordaz, até mesmo, menos acutilante, mas, verdade seja dita, se agisse dessa forma estaria a trair tudo aquilo que sou enquanto homem. Por outro lado, esta mesma forma de estar também me brindou com amigos e algumas outras afinidades, baseadas no respeito e não na concordância absoluta com a minha postura.

Do mesmo modo que não me coíbo de dizer, alto e bom som, as minhas opiniões, também sei remeter-me ao silêncio, sempre que acho ser necessário. Aliás, quando o faço é por ter a certeza que, a quem muito prega, pode acontecer uma de duas coisas; torna-se repetitivo e completamente previsível, e desse modo a mensagem não passa; ou limita-se a falar sozinho, que é como quem diz: prega no deserto.

Estando eu numa destas fases em que prefiro reservar-se ao silêncio e deixar a minha irreverência descansar um pouco, surge-me a prova que nem mesmo sossegado no meu canto as pessoas me esquecem. As pessoas não entendem que o meu silêncio não significa que tenha deixado de ter uma opinião porquanto, pior do que não opinar é não ter opinião alguma.

Mas, dizia eu, estando em fase mais comedida e pouco interventiva, eis que, ontem, numa conversa com um autor, disse-me o próprio, em jeito de queixume envergonhado, que pretendia que eu fosse o prefaciador do seu último livro e que só não me convidou para essa tarefa porque a pessoa responsável pela editora o desaconselhou a agir desse modo.

Se, por um lado, compreendo e até aceito a relutância desse/a responsável editorial em ver o meu nome associado a um dos seus produtos, já fica mais difícil entender como é que um autor sujeita a sua vontade, se é que ela realmente existiu, aos caprichos de terceiros. Pelo menos esse/a responsável guia-se pelos mesmos preceitos que eu: diz o que pensa e age pela sua cabeça. O mesmo não se poderá dizer do autor.

Queixam-se de ouvir o que não gostam mas, nem mesmo sossegado no meu canto, me deixam.


MANU DIXIT 

terça-feira, 11 de outubro de 2016

EU FALO DE... SIMPLESMENTE POESIA

SAIBAM MAIS DO LIVRO NESTE LINK

Regra geral, quando falamos com autores sobre os processos criativos e os conceitos de poesia ficamos com uma ideia mais ou menos clara daquilo que cada um escreve. Por isso, na hora de lermos os seus livros, já sabemos de antemão o que esperar, e normalmente, se nos surpreendemos, é pela negativa. Contudo, existem excepções à regra.

Serve o parágrafo anterior para vos apresentar um livro que me surpreendeu positivamente, não tanto pelo conteúdo mas mais pela discrepância entre o que li e as poucas conversas que tive (todas em ambientes tertulianos) com o autor.

Nos encontros de autores, escutarmos sempre aquelas velhas máximas: "Escrevo o que me vem da alma", "A minha poesia vem de dentro", "Escrevo o que sinto e vejo", "Escrevo sobre o que me rodeia". Diz-me a experiência, de muitos eventos literários, que quando alguém profere uma destas frases é como se dissesse: "Os poemas que escrevo são todos iguais e se lerem o primeiro, o da página vinte ou o da cem, vão ter as mesmas sensações". E autores desses temos aos milhares. Basta estar atento ao que se vai editando para perceber essa realidade.

Quando, no final de uma dessas tertúlias, Luís Sequeira Lopes me entregou o seu livro e pediu que escrevesse uma crítica, confesso, com a franqueza habitual, ter pensado que SIMPLESMENTE POESIA seria mais um daqueles livros, que tantas vezes me passam pelas mãos, com um conteúdo enfadonho e cuja leitura seria penosa. Com a mesma franqueza assumo o quanto estava enganado.

Para começar tenho de dizer que o título SIMPLESMENTE POESIA não poderia estar mais bem entregue. Este é de facto, e com toda a propriedade, um livro de poesia, do princípio ao fim. Com uma estruturação lógica e sólida, os poemas são-nos apresentados de forma honesta; equilibrados, coerentes e com uma riqueza vocabular cada vez mais rara. Cada poema respira por si só em cenários montados para cada um deles, ou como diz, e bem, a prefaciadora: "... dando origem à criação de dissemelhantes poemas". Para além disso, as temáticas jamais se atropelam (como tantas vezes acontece noutros livros), o que, salvo melhor opinião, lhe confere uma mais-valia importante.

Ao ler esta primeira obra, de Luís Sequeira Lopes, e tendo em conta as suas intervenções nas tertúlias, chego à conclusão que, através da leitura dos seus poemas, passei a conhecer mais e melhor o autor, porquanto, tal como disse anteriormente, existe uma tremenda discrepância entre os discursos nas tertúlias e os poemas deste livro. O mesmo é dizer: Luís Sequeira Lopes diz as mesmas frases comuns e as mesmas velhas máximas que a quase totalidade dos autores mas escreve como poucos.

Só consigo explicar esta discrepância afirmando que estamos perante alguém que apenas se liberta completamente quando tem a caneta na mão (ou em frente ao ecrã do computador) e que na presença de outros autores (nem todos mais experientes mas mais ousados) revela a sua faceta mais introvertida.

Quem escreve com a qualidade demonstrada neste SIMPLESMENTE POESIA tem, indubitavelmente, uma voz própria e não pode, nem deve, explicar a sua poesia e os conceitos que a regem com lugares comuns ou frases batidas. Quem traz à estampa um verdadeiro livro de poesia como este deve sentir-se mais seguro de si, na presença de outros autores, e lembrar-se que não é o volume da obra nem a extensão da mesma que faz um bom autor, é a qualidade. E essa não falta em SIMPLESMENTE POESIA.

MANU DIXIT